Incidir sobre um acordeão um tributo inteiramente dedicado a Lou Reed consegue ser ainda mais arriscado que a conversão para português do cancioneiro clássico de David Bowie executada pela voz de um brasileiro, Seu Jorge, tal como o conhecemos a The Life Aquatic do prodigioso realizador Wes Anderson. A veterania, porém, acompanha Andrea Ross, detentora de assinalável culto enquanto Angel Corpus Christi, que havia já ensaiado a aproximação ao espólio Reediano em Accordion Pop ou I Love New York, auto-elucidativos nos títulos representativos da tendência para o formato cover mais apontado à elegia nostálgica do que à originalidade.

Tratou a Gulcher, desarrumada casa orgulhosamente DIY, de pagar amor com amor e reavivar a carreira de Angel Corpus Christi que, após ver reeditados alguns dos seus discos esquecidos, obtém, com Louie Louie (repare-se na clonagem da lendária capa de Transformer de Reed), licença para invocar o músico nova-iorquino com músicas da autoria do próprio e outras acerca do mesmo. A obsessão compulsiva por Lou Reed surte resultados que, à custa das garantias oferecidas pelos originais, dificilmente podiam falhar (caso de “She’s my Best Friend� ou “The Day John Kennedy Died�) e outros que se evidenciam tortuosos logo após a partir dos 30 segundos (o reggae montado em andas rachadas de “Banging on My Drum� ou aqueles em que surge o flow que Andrea Ross bem podia poupar para brincadeiras de estúdio).

Louie Louie singra essencialmente pelo valor curioso que garante como novelty (ainda assim, descartável), mas revela em demasia as fragilidades de um acordeão mal acompanhado, quando exceptuado o factor Lou que apelará principalmente a fãs.