DISCOS
MUDDO / Maria
Space Between Something EP / Isto Nem É Uma Beat Tape EP
· 18 Nov 2016 · 21:43 ·
MUDDO / Maria
Space Between Something EP / Isto Nem É Uma Beat Tape EP
2016
Alienação / Ed. de Autor
MUDDO / Maria
Space Between Something EP / Isto Nem É Uma Beat Tape EP
2016
Alienação / Ed. de Autor
O som dos subúrbios.
Esta é a história de um artista em constante evolução. Quando conhecemos pela primeira vez David Almeida, ele andava a polvilhar o reggae boa onda dos Black Bombain (que durante muitos anos foram o único elo de ligação de Alverca com a música) com o som que provinha dos seus teclados. Anos depois, encontrámo-lo nos A2 Project, projecto de electrónica suave com influências drum n' bass, sobre o qual até falámos aqui. Daí aos brevíssimos Mate - que chegaram a participar num Vodafone Band Scouting - foi um pulinho, e ao longo de meses fomo-nos deleitando com as malhas que nos ia enviando por chat, iluminando as noites aborrecidas de mais uma cidade suburbana no mapa.

Tanta produção, tantas experiências e tanto suor derramado por cima de todos os aparelhos que utiliza para construir a sua música depois, David Almeida teria que colher, naturalmente, os frutos do seu trabalho. Eis-nos chegados tanto a MUDDO como a Maria, dois dos monikers com os quais fez música em 2016, e que o têm levado a andar de boca em boca, dos agentes mais refundidos - como os do Desterro - aos mais estelares - como o Rimas & Batidas de Rui Miguel Abreu. Foi sorte? Não, foi qualidade. E isto é bonito; é que longe de patriotismos ou bairrismos bacocos, ver um gajo da terra a dar cartas (e a dá-las porque, de facto, oferece algo que deve ser valorizado) quase que faz o nosso coração de pedra soltar uma lagrimita.

Isto é música sobretudo para os subúrbios, para todas as facetas desta geração que habita a zona cinzenta que existe entre a cidade grande e o espaço rural. Se MUDDO se atira ao house e constrói melodias cósmicas passíveis de serem dançadas nos Lofts desta vida, Maria é o lado guetizado da juventude que quer mais. Um é hedonismo, o outro consciência. Duas faces de uma só moeda cunhada no mesmo local. Dois vértices de um gajo polimórfico, dentro da electrónica, uma pessoa sem um único estilo definido, mas todos os estilos possíveis.

Dito isto, exalta-se a evolução. Olhemos para MUDDO: a onda deep de "Conforto" provoca isso mesmo, sendo que não existe maior conforto do que aquele de acelerar viaduto fora rumo aos milhares de luzes onde encontraremos os amigos e a felicidade, o carro ronronando ao som do beat. É uma sonoridade chill próxima da dos A2, mas que pegou nessa blueprint e a fez progredir até mais além. A espaços, até relembra um Todd Terje - mas à portuguesa. O trance de "Mais Tempo" e a guitarra pós-punk presente em "Pode" são os outros dois grandes pontos altos de um EP em que se entra mudo e se sai a sorrir.

Já Maria bem pode dizer que Isto Não É Uma Beat Tape, mas a verdade é que o é. Assim como o futuro será quando quisermos e este, para já, parece ser o futuro. Em 28 minutos de samples e beats construídos de forma irrepreensível, a Maria dá-nos a conhecer um mundo gigante de possibilidades e devaneios, naquela que é uma das grandes surpresas do ano - capaz de combater, olhos nos olhos e sem exageros, com gigantes como os Orelha Negra. Tudo findando na melancolia vocoder de "(Não Quer Ser Nada)". Enormíssimo.
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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