bodyspace.net


CBT Dance Festival 2003
Celorico de Basto
02/08/2003


Comecemos por especular. Um concerto tem início marcado para as 23.30h e deveria terminar à 01.00h. Logo, teria uma duração de aproximadamente hora e meia. Imaginemos que começa quarenta minutos atrasado, e ao contrário do previsto apenas tem de duração cinquenta minutos… pode-se especular que a falha da organização nos tirou quarenta minutos daquele que foi o momento mais alto do festival. Isto aconteceu no CBT, e a explicação até pode nem ser esta, mas os números não mentem e não deixam de ser curiosos e certeiros.

Certeira foi também a escolha de Herbert e a sua big-band, que brilharam, encantaram e puseram o público nas suas mãos. O concerto iniciou-se com um trompete a ser utilizado como um sino, e a partir daí a normalidade não imperou, tendo o concerto proporcionado momentos arrojados e a roçar a perfeição. No início de cada tema assistimos a uma aula de “samplar” no momento, desde rasgões a revistas e flashes das máquinas fotográficas com as quais todos os elementos da banda estavam munidos, a um grito de Dani. Tudo serviu para, nas hábeis mãos de Herbert, dar o mote para um espectáculo em que o jazz e a electrónica se empurraram reciprocamente para os seus limites.
Com Dani nas vocalizações, “Goodbye Swingtime” foi explorado e alterado, ficando patente uma simbiose perfeita entre a orquestra e Herbert, havendo ainda tempo para revisitar dois temas de Bodily Functions, temas esses que brilharam pela alternância entre o house e o jazz, conseguindo estabelecer uma ponte entre estes dois álbuns. Versões deliciosas, com Dani a mostrar-se em todo o seu esplendor e a evidenciar que o jazz já andava escondido nos anteriores trabalhos de Herbert.

Saltou-se então à Tenda Electro, onde se iniciava o concerto de Peaches. Figura esbelta, mini-saia e colete cor-de-rosa, poses lascivas, letras insinuantes. Colete desaperta-se, à terceira música já se encontra no “colo” do público, salta fora a saia e quando abandonámos para ver Spacek, Peaches quedava-se pelo soutien preto e calções brancos diminutos… Quem sabe se terá ficado por aí? O que assistimos foi entretenimento puro, numa música que mistura o hip-hop com o rock e uma atitude irreverente, sobre um som eléctrico e rasgado.

Na Tenda Heineken, estranhamente, Spacek ainda não actuavam! Isto uma hora depois de Herbert ter terminado… Porquê? Por manifesta incapacidade da organização, quer no desmontar/montar do palco, quer nos engenheiros de som que teimavam em não acertar com o pretendido. Perante um público cada vez mais escasso, Steven Spacek resolve iniciar, apenas com o apoio do baixo (a bateria, programações e teclas ainda andavam às voltas com os engenheiros) num registo soul, em que a voz tomou papel principal. Continuava a faltar algo: Power, we need more power on the stage, disse Steven Spacek diversas vezes. Como se sabe, este é um dos principais atributos dos Spacek, que foram obrigados a registos mais suaves, em que se confirmou a excelência da voz mas faltaram os sons graves, fortes e poderosos que tantos queríamos ouvir.

A Tenda Techno era um pouco o reflexo da imagem do festival: pouco público (cinco mil pessoas no total), bastante pó, e apenas Jeff Mills conseguiu uma assistência digna.

De volta à Tenda Electro onde DJ Kitten - fenómeno de popularidade (quase faz o pleno nos festivais de Verão) -, perante um público fiel (as noites Kitten no Triplex e Lux têm cada vez mais adeptos), não surpreendeu. Num registo musicalmente estático, que se transpôs também para o público, não foi a dança quem mais ordenou. Apesar de ter conseguido momentos interessantes, acabou por ser uma actuação monótona. Também aqui houve falhas técnicas, que a grande parte do público julgou ser um recurso técnico do DJ, a julgar pelos aplausos…

Com um calor insuportável nas tendas, deixou-se com alguma dificuldade a Tenda Electro (as portas giratórias não foram boa opção) e resolveu-se dar uma olhadela a I-Wolf (incluindo o baterista dos Sofa Surfers), que acabaram por surpreender pela positiva. A sonoridade de I-Wolf assemelha-se à de Spacek, embora o DJ presente neste colectivo incutisse um toada mais dançante e estivessem apoiados por um vocalista que brilhou mais pela dança e boa disposição do que propriamente pela sua voz.

E ficou por aqui o CBT 2003, em que mais uma vez o publico não aderiu - o que põe em causa a sua estrutura, localização e/ou existência.
Alguns (bastantes) reparos à organização, que quer por atrasos, quer pela má escolha das condições físicas, quer pelas más condições técnicas, não permitiu que um cartaz invejável brilhasse a toda a altura. Assim, é complicado tornar-se uma referência dos festivais de Verão.

Miguel Marques