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Faust / Dälek
Casa da Música, Porto
14/04/2006


Numa altura em que se celebrava o primeiro ano de existência da Casa da Música (embora não tenham existido celebrações oficiais), o concerto de Faust no Porto (uma das poucas cidades europeias a receber a banda alemã) celebrava igualmente outro acontecimento: os 35 anos de existência da banda a quem atribuem a paternidade do krautrock. A história dos Faust é, sabe-se, longa e cheia de recuos e avanços, mas aqui estão eles no século XXI a mostrar a razão pela qual foram consideradas uma das bandas mais influentes dos anos 70 (muito por culpa de discos como Faust, Faust so Far, The Faust Tapes e Faust IV). A formação já sofreu bastantes alterações desde os primeiros tempos: os Faust de hoje são Hans-Joachim Irmler (teclados), Steven Wray Lobdell (guitarra), Michael Stoll (baixo e flauta), Lars Paukstat (percussão e vozes), Jan Fride-Wolbrandt (bateria) e John Silk (som). Apesar das mudanças no line up original, os Faust mostraram, num palco com um cenário muito sui generis (a fazer lembrar uns Pink Floyd em Pompeii) e numa primeira construção de mais de meia hora, tudo aquilo que ainda tinham para mostrar e que a formação que agora defende as cores do grupo alemão exibe um entendimento capaz de resultar em momentos de grande e renovado interesse para o público.

Faust © Vítor Barbosa (DR/Casa da Música)

Foi de facto de longas e intensas explorações que se fez a actuação dos Faust. Da combinação da guitarra de Steven Wray Lobdell, da bateria de Jan Fride-Wolbrandt (que tirando as vezes em que fez lembrar uma bateria de rock de estádio foi essencial na construção dos temas) e pelo baixo de Michael Stoll (que também tomou conta da flauta e do contrabaixo). O jovem e alienado Lars Paukstat foi responsável pela percussão mais peculiar e pelos utensílios bizarros (ferros contra ferros numa banca que não passava despercebida a ninguém e até uma enorme chapa metálica onde Lars Paukstat chegou a bater com umas correntes e com um enorme martelo, produzindo o barulho imaginável) e também pela introdução em alguns momentos de vocalizações em alemão em inglês que continuavam em loop por mais ou menos tempo, conforme o efeito desejado.

A certa altura, surpreendentemente, os Faust, depois de tanta exploração e experimentalismo, haviam de cair no formato canção rock ‘n’ roll que, contudo, desapareceu logo depois. A parte final do concerto fez-se de muita percussão e de algumas surpresas. A certa altura, Lars Paukstat chegou-se à frente onde estava uma enorme viga de ferro e, com uma rebarbadora, provocou uma verdadeira explosão de faíscas (que atingiu o corajoso público instalado nas primeiras filas) que durou alguns minutos e que produziu um efeito sonoro e visual impressionante. Pouco depois o mesmo Lars Paukstat pegou noutra rebarbadora para fazer o mesmo junto da grande chapa de ferro que se encontrava junto de um dos lados do palco. Pelo efeito surpresa provocado por certos elementos e por alguns realmente excelentes momentos de exploração, os Faust de hoje não envergonham quando comparados com os Faust dos anos 70.

Dälek © Vítor Barbosa (DR/Casa da Música)

Na primeira parte do concerto estiveram os Dälek, duo formado por Will Brooks (na voz) e Oktopus (nas máquinas) que gravaram em tempos Faust vs Dälek com os Faust. Mas era obviamente Absence o principal motivo da noite; isso e todos os temas que perfazem a visão dura e negra do hip-hop de Dälek. São batidas fortes e agressivas a que se juntam guitarras de características iguais abastecidas por letras inteligentes e, muitas vezes, sarcásticas. Mas se no caso dos Faust os lugares sentados favoreceram o ambiente geral que se vivia em palco (explorações muitas das vezes de volume reduzido e plenas de pormenores), o mesmo já não se pode dizer dos Dälek (temas duros, rudes e sempre com o som no vermelho). Tanta agressividade merecia uma forma capaz de resposta do público que não a sentada.


André Gomes
andregomes@bodyspace.net
14/04/2006