bodyspace.net


Puce Mary / Rui P. Andrade & Aires
Galeria Zé dos Bois, Lisboa
20-/03/2019


À porta da ZdB, Puce Mary nem parece a mesma pessoa que, poucos minutos depois, iria subir ao palco montado no aquário para mostrar ao público lisboeta os temas de The Drought, álbum que lançou no ano passado. Sorridente, simpática, intrigada pela existência de uma aplicação como a Glovo e pelo uso que um camarada madeirense fez do mesmo, ao mandar vir uma cerveja artesanal de uma Cerveteca que se encontrava a 10 minutos a pé.

Depois, tudo se transforma e temos Puce Mary, a artista, noisenik suprema que encontra na electrónica mais abrasiva e na voz - quase sempre imperceptível - o seu modus operandi. O ruído (en)contra o corpo; ouvimo-la clamar por esse mesmo corpo, ao mesmo tempo que caminhava pelo palco, dava encontrões ao público presente, se deitava no chão em agonia ficcionada. Não por completo: esta música será (e é-o para muita gente) para ela catarse. Quando os graves fizeram tremer a sala poucos ou nenhuns terão ficado indiferentes. Só faltou - e esta é uma humilde e honesta opinião - alguma violência; o noise precisa dela.

Antes disso, não houve violência mas viagem, a mesma que já fizemos por diversas vezes com a dupla Rui P. Andrade + Aires. Repetições, drones, melodias rudimentares e sintetizadas, a montanha, o rochedo, o mar, a neblina - toda uma Madeira diante dos nossos olhos e a emprenhar-nos os ouvidos. No final, as aves partem em busca de um verão infinito e deixam-nos regressar à tranquilidade da apatia urbana. Óptimo, como sempre.

Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
27/03/2019