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Kamasi Washington
Tivoli BBVA, Lisboa
07-/06/2016


Com um disco The Epic na bagagem, magnífico álbum triplo que apresentou ao mundo a sua voz própria, o saxofonista e compositor Kamasi Washington veio a Portugal apresentar-se ao vivo em dois concertos, primeiro na Casa da Música no Porto, depois no Tivoli BBVA em Lisboa. Fomos assistir à actuação de Lisboa e, perante uma sala cheia, Kamasi liderou um octeto fora do comum. A acompanhar o saxofonista estavam Patrice Quinn (no voz), Ryan Porter (no trombone), Rickey Washington (pai de Kamasi, no saxofone soprano e flauta), Brandon Coleman (nos teclados), Miles Mosley (no contrabaixo), Tony Austin e Ronald Bruner Jr. (nas baterias).



A música do disco The Epic foi naturalmente a base da actuação mas, não sendo possível encaixar todo o disco no palco, ficou-se por uma selecção de alguns temas mais eficazes. O concerto abriu com “Askim”, com o octeto a trabalhar uma interpretação cheia de groove e funk. Esta foi a matriz que atravessou todo o concerto, com uma secção rítmica sólida a sustentar a base – duas baterias e um contrabaixo com um som mais alto do que o habitual. Em cima dessa base Coleman trabalhava a harmonia - teclados diversos, incluindo uma foleiríssima “keytar”.

Kamasi Washington assumia a liderança, ao leme no seu saxofone tenor, construindo solos inspirados. Mais na sombra ficava o trombone de Porter, apenas a sublinhar e complementar as linhas do safoxone, sempre discreto. A voz de Patrice Quinn aparecia mais pontualmente (apenas quando solicitada), tal como o palhetista Rickey Washington, pai de Kamasi – eficaz mas não deslumbrante, valeu pelo simbolismo do gesto.



O concerto inclui um tema clássico da história do jazz, “Cherokee”, aqui interpretado numa versão arrastada – uma opção de arranjo curiosa, sobretudo para um tema associado à velocidade vertiginosa do bebop. Escolha pouca óbvia também, mas que integra o álbum, foi a inclusão de “Clair de Lune”. O eterno tema de Debussy não só atravessa séculos imaculado, como acompanha na perfeição o chafariz da cena final do filme Ocean’s Eleven, como sobrevive a esta revisão jazz, com Kamasi a não perder o foco da melodia principal.

Há ainda espaço para um momento exclusivo de baterias. Saem os restantes músicos do palco, sobram apenas as duas baterias de Tony Austin e Ronald Bruner Jr.: começam por dialogar, depois cada um trabalha o seu solo - espectacularmente enérgicos, mas musicalmente pouco relevantes (apesar de tudo, Bruner Jr. pareceu um pouco mais interessante).

© Nuno Martins

Para fechar o alinhamento oficial, Kamasi Washington atacou um dos temas mais memoráveis do disco triplo, “The Rhythm Changes” – com a voz de Patrice em destaque. Já no encore, obrigatório pela pressão do público, houve espaço para solos de todos os músicos, funcionando como apresentação de cada um. Com muito groove e funk, Kamasi apresentou ao vivo um jazz acessível e sedutor. O público saiu rendido, com toda a naturalidade.

Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
14/06/2016