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João Hasselberg
Centro Cultural de Belém, Lisboa
05-/09/2015


Com dois discos na bagagem e, imaginamos, a caminho do terceiro, o contrabaixista João Hasselberg foi ao Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém apresentar a sua música original. Mais do que um sólido contrabaixista jazz, Hasselberg é um compositor ímpar, que nos vem apresentando uma música arredondada, com grande ênfase melódica, atravessando universos, indo do jazz à folk, sem se fixar demasiado a um único género.

© Márcia Lessa

A sala do CCB estava cheia e Hasselberg arrancou o concerto apropriadamente com “Opening”, com a voz de Joana Espadinha em destaque. Seguiu-se “Perry Smith’s Dreams”, um outro tema do segundo disco Truth Has To Be Given In Riddles (2014), agora realçando o trompete de Diogo Duque. Metade do grupo abandonou o palco e, apenas em trio (piano, contrabaixo e bateria), foi interpretado um dos mais belos temas de Hasselberg, “The Old Man and The Sea”, com Luís Figueiredo a espremer das notas pingadas do piano toda a expressividade melódica. De regresso ao segundo disco, o grupo atacou “Abraham's Doubt”, com o trompete a voltar a roubar o protagonismo.

Num concerto de João Hasselberg o grupo nunca é estático: para cada tema entram e saem músicos de palco, consoante cada composição pede. Dependendo de cada tema, poderão estar oito músicos em palco, ou poderá estar apenas um – é a música que chama os músicos, não o contrário. Este concerto teve como bónus uma projecção de vídeo e animação (trabalho de João Pombeiro e Camila dos Reis) que complementava a toada doce da música de forma perfeita.

© Márcia Lessa

Após aqueles quatro primeiros temas, Hasselberg apresentou um bloco de três novos temas. O primeiro inédito, “Kenji in Burma”, mais denso, voltou a chamar o trompete, para depois dar lugar a um longo solo de bateria de Bruno Pedroso. Seguiu-se uma composição chamada “Ela”, a incluir na banda sonora de um filme português a sair em breve, onde reencontramos o melodismo habitual. E, por fim, “Mishima”, convocou a dinâmica jazz do grupo. Apesar de não serem conhecidos, os temas novos não fogem ao universo musical que lhe ​re​conhecemos e foram bem recebidos.

Regressaram depois composições com as quais a maior parte do público já estaria mais familiarizado. “Two brothers in a treasure hunt”, bela balada folk amplificada pela magnífica voz de Joana Espadinha, será talvez o tema mais acessível da discografia e tem potencial para fazer chegar a música de Hasselberg a públicos mais alargados. Também na voz de Espadinha, seguiu-se “The ballad of the Sad Café”, tema que conta com letra de Luísa Sobral.

© Márcia Lessa

Com “For Charlie” entramos numa toada mais melancólica, com todo o grupo (excepto o contrabaixo) envolvido numa belíssima homenagem ao contrabaixista Charlie Haden - este tema terá sido escrito por altura da sua morte. “En Madrid”, o tema que mais puxa pela dinâmica jazzística, levou ao palco o saxofonista Ricardo Toscano, que se mostrou exuberante (como sempre, aliás). O concerto fechou com “To a God Unknown”, novamente com a voz de Espadinha em foco. Choveram aplausos e os músicos só puderam abandonar o palco depois de um encore, com “In Cold Blood”.

Ao sairmos da sala somos invadidos pela inevitabilidade do balanço de ocasião, de tentar sintetizar em algumas palavras aquilo que acabámos de ver. Sai apenas uma frase simples: não há mais ninguém a fazer música tão arredondada como esta. Que venha depressa um próximo disco.

Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
08/09/2015