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LISB-ON
Parque Eduardo VII, Lisboa
5-6/09/2015


Saímos de casa no sábado com a convicção de que estão reunidas todas as condições para que a segunda edição do LISB-ON, mini-festival de verão dedicado essencialmente à música de cariz electrónico, providencie novos momentos capazes de saciar a nossa sede pela arte do som. Pelo menos, o sol convida, o espaço é acolhedor e as escolhas de Isilda Sanches - a quem coube abrir o festival - não nos fazem pensar de outra forma. No primeiro dia, celebrou-se sobretudo o DJ Set, excepção feita aos Fandango, projecto que mistura acordeão e electrónica numa linguagem pop que ora se mostra minimamente interessante, ora resvala para campos já próximos daquilo que uma vez se decidiu etiquetar de electro swing - Yolanda Be Cool e aquele mega-hit de seu nome "We No Speak Americano" quase que poderiam ter passado por aqui. Seguiram-se os Mirror People, de Rui Maia, com o disco a tomar conta do recinto, coadjuvado por uma vocalista endiabrada e um público que o acolheu de braços não abertos, mas no ar.

Se Palms Trax se apresenta esforçado, num live que pouco ou nada entusiasmou (John Talabot soou, não a influência, mas a pastilha elástica, tamanha era a colagem), foi de Nicolas Jaar a grande vitória do primeiro dia do certame, e foi dele também a maior afluência de público. Por um lado questionamos o hype em torno do norte-americano; por outro, lembramo-nos de que Space Is Only Noise, de 2011, é quiçá um dos melhores discos da década e não há como colocar a sua qualidade em causa quando conquista o público logo nos primeiros cinco minutos, que explode de fervor nacionalista ao escutar "Vampiros", de Zeca Afonso; momento ainda mais bizarro (e hilário) quando o público do LISB-ON se situa, grosso modo, num espectro político oposto ao de Zeca... A fechar o primeiro dia, a regressada Nina Kraviz - que goza de uma enormíssima popularidade em Portugal -, ostentando um merecido estatuto de cabeça de cartaz; porém, em três horas de set, as suas escolhas, viradas sobretudo para o techno em todas as suas vertentes (dub e deep à dianteira), aborreceram mais do que divertiram.

O segundo dia registou, parece-nos, uma menor afluência de público, ainda que da organização tenha partido o aviso, durante a tarde, que os bilhetes haviam esgotado. Contudo, não seriam mais de trinta aqueles que assistiram ao set de Rui Miguel Abreu, facto comprovado mal chegamos novamente ao recinto e ouvimos o doce pulsar da "Southern Comfort", de Burial. Com a chegada de Mr. Herbert Quain, o número duplicou - tanto porque os seus amigos da ZigurArtists e de Lamego se colocaram junto das grades em jeito de apoio, tanto porque deu, como é seu apanágio, um belíssimo concerto. Não faltou, como é óbvio, "After The Waiting You'll Have It Twice", malha que tem o condão de soar cada vez melhor de cada vez que a escutamos. Porra!

Os australianos Andras & Oscar foram um acto semi-falhado; há algo que falta nas suas canções, uma soul electrónica que na verdade não sabe muito bem o que quer ser, com um simples teclado e uma caixa de ritmos a ditar a música, parecendo tudo isto banda-sonora de esplanada à beira-mar (sendo que era esse, se calhar, o seu propósito) em vez de proposta para se dançar numa tarde quente. O que é pena: este mesmo Andras é Andras Fox, autor de um óptimo EP no ano passado, Vibrate On Silent. Mas se com eles pouco nos desfizemos do formigueiro nos pés, com os distintos Jazzanova a coisa foi bem diferente; uma banda inteira a fazer a festa, com congas, saxofones, teclados, baixo, e um MC - Paul Randolph - a puxar muito bem pelo público. Matou-se, definitivamente, as saudades do nu jazz.

Todd Terje era muito aguardado, tanto por nós, como pelas raparigas que um dia decidiram aprender norueguês e que seguiram até ao LISB-ON empunhando cartazes com um simples "amo-te" na língua-mãe do senhor; a parte triste da história é que essas mesmas raparigas não viram realizado o seu desejo de casar com Terje, nem o público lisboeta viu dele um concerto digno daquilo que é o seu nome. Demasiado solitário em palco, e mais em modo DJing que no prometido live, de Terje só se salvou "Delorean Dynamite" e, evidentemente, "Inspector Norse" a fechar - tudo o mais ficou bem guardado na memória daquele excelente concerto no Primavera Sound do Porto. Terminado o concerto, fica a tarefa de lançar os últimos fogos a cargo de Michael Mayer, num belo set orientado para o techno (como se quisesse ensinar uma coisa ou outra a Nina Kraviz...), que findou com a mais inesperada das escolhas: "Love Is In The Air", de John Paul Young. Final melhor era impossível para um evento onde o amor poderia estar mais bem representado - mas, estando ainda praticamente na sua infância, haverá decerto muito mais oportunidades para nos apaixonarmos à séria.

Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
07/09/2015