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Green Ray - Panda Bear / Actress / Eric Copeland / bEEdEEgEE
Lux, Lisboa
13-/12/2013


Expectativa, muita. Nervos, alguns. Ansiedade, pesada. Alegria, quase euforia. Não era pelo dia 13 que aquela sexta-feira assinalava, não era pelos bruxedos, mas antes pela antecipação que nos assaltava quando pensávamos em olhar de perto para Panda Bear, Eric Copeland, Actress e bEEdEEgEE. Isso e o medo de voltar ficar à porta naquela que se viria a revelar uma das noites mais desalinhadas com o mundo que já experienciámos.

bEEdEEgEE © José Miguel Silva

Afinal entrámos. Dominados pelo nervo miudinho, sem saber para onde ir ou o que ver, preocupamo-nos em evitar uma pista deserta e acabar o centro das atenções. Agradecemos a varanda e, um cigarro e dois lances de escadas depois, estávamos na cave escura do Lux. No palco, um Eric Copeland possuído e curvado perante uma megalomania de cabos e botões ia manipulando uma harmónica banhada em ácidos. A discografia de Copeland, extensa, permite-lhe avançar sem interrupções por um mar de ruído e electricidade. Com Joke In The Hole à cabela, deslinda-se a escola que Copeland formou nos Black Dice e é impossível ficar indiferente às construções livres, sempre perpassadas por uma espécie de ingenuidade latente - na melodia e nos loops de voz convulsa. Curvados perante as batidas grandes e redondas, deixamo-nos levar, em surdina e em surdez.

Eric Copeland © José Miguel Silva

A audição ainda era dominada pelo tínito quando, no piso de cima, os Gala Drop em modo dj-set partilhavam groove, soul e funk de forma tão despreocupada, quanto previsível. A pista continuava deserta, mas lá baixo, Noah Lennox já era Panda Bear. Podemos vê-lo uma e outra vez e continuamos a ficar perplexos como ele nos mostra que a fórmula para criar vida é, afinal, simples. Se falámos de ingenuidade aparente em Eric Copeland, temos que falar da inocência feliz que Lennox evoca. Ouvi-lo é deixá-lo de ter preocupações. É acabar a guerra, a fome e todos esses sonhos de miss Mundo. Ouvi-lo é ser criança de novo, poder sonhar e entregarmo-nos sem chatices à vida. A voz de Lennox é o seu instrumento mais forte: é ela que carrega os sentimentos, inteligentemente ordenados e dispostos em camadas que se transformam em pegajosas lengalengas musicais. Num concerto equilibrado, Panda Bear deixou perceber que vai continuar introspectivo quando tiver que o ser , mas sem medo de recorrer a batidas contundentes e groovadas para ficar ainda mais próximo do ritmo. O objectivo parece ser mais fazer dançar e menos provocar uma viagem. Por nós, tudo bem.

Panda Bear © José Miguel Silva

Com receio que Brian DeGraw provocasse uma catarse irreversível no sentimento de sonho que trazíamis, demorámos a chegar ao piso superior do Lux. E a verdade é que bEEdEEgEE, o alter-ego caótico do líder dos Gang Gang Dance, acabou por não (sur)pre(e)nder. A espécie de dossel constantemente bombardeado por projecções coloridas deixava uma pista de psicadelismo, mas a música de bEEdEEgEE está longe de lá chegar. Talvez tenha sido por termos saído de dois belíssimos (e arriscados) concertos, mas acabámos indiferentes às melodias catchy e por vezes de gosto questionável de DeGraw. Talvez um dia venhamos a ouvir esta "pop" na rádio, mas até lá saberemos esperar.

A pontinha de desilusão que bEEdEEgEE deixou acabaria por se dissipar - ou antes arrancada da pele e do corpo - pelas mãos (e mente) de Actress. O concerto até começou mansinho, com um baixo bojudo e um kick tímido, que apenas a espaços era permitido soltar-se. Numa atitude quase provocatória, Darren Cunningham privilegiou a cerebralidade e a sensorialidade nos primeiros minutos do concerto. A isto, juntava-se a tensão dos graves submersos e corpos que reagiam violentamente a uma espécie de ressaca de movimento, dançando como podiam. A surrealidade deste cenário só foi quebrada quando Actress pareceu satisfeito - talvez por finalmente estar a manietar todos os que tinham perante si - e deixou soltar a batida. A benção foi recebida por corpos desenfreados, mas não sem denotarmos que em Actress nada parece rápido. A sensação de o ouvir, de lhe sentir as texturas, é como um aparente flutuar pelo qual nos deixamos sempre levar. Num constante jogo de tempos e volumes, onde todas as peças acabam por cair no lugar certo, Actress acabou por construir uma viagem que acaba da mesma forma como começou: onde ele bem entender, quando ele muito bem entender. A nossa acabou aqui.

António M. Silva
ant.matos.silva@gmail.com
19/12/2013