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A Place To Bury Strangers / Bambara / 10 000 Russos
Centro Cultural do Cartaxo, Cartaxo
2-/11/2013


Uma boa parte da experiência Sessions é o par de horas que antecede o início dos concertos: um belíssimo e barato jantar na Ribatejana, confraternizando (ou não) com as bandas que, vindas de fora, aqui param para um tranquilo repasto e dois dedos de conversa com a organização antes de espalharem magia no Centro Cultural. Propaganda feita, importa dizer que uma sala bem composta recebeu a estreia nacional dos norte-americanos A Place To Bury Strangers, pérola da nova vaga gaze e banda que atraiu, sobretudo, imensa gente de alma e vestimenta negra: será que alguém disse à malta gótica que isto era Jesus & Mary Chain com uma drum machine?

Atacando o palco por volta das 23h, os 10 000 Russos assumem-se cada vez mais como um dos grandes valores portugueses - ou soviéticos - deste ano de dois mil e treze; o chug-chug-chug rítmico, as incursões AlanVeguianas nos vocais, a guitarra cuspindo ruído bravo. São apenas dois. E têm um som tão perfeito que não precisam de mais absolutamente nada, ali. Não fora o facto de serem banda de abertura de uns tipos capazes de rivalizar com os MBV's desta vida em termos de assalto sonoro, teriam varrido completamente esta noite. E mereciam claramente que alguém tivesse ido para junto do palco...

...tal como aconteceu com o odd one out desta noite, o trio de Brooklyn que vai pelo nome de Bambara. "Venham todos cá para a frente!", gritava-se sem sucesso, e, admitamos, sem algum sentido, já que os Bambara não passaram de uma diversão momentânea enquanto se esperava pelos cabeças de cartaz; o mote era tentar descobrir, no espaço de tempo em que tocaram, que banda queriam realmente eles ser: se os Cure, se os Gang Of Four, se os Comanechi ou Prinzorn Dance Schools desta vida, algo que pudesse caber na DFA mas com o bónus de terem uma guitarra distorcida. Não os conhecíamos antes, mas também não fizeram para que os queiramos conhecer melhor.

Sob uma espessa nuvem de fumo entram os A Place To Bury Strangers, já depois de alguns terem abandonado o conforto das suas cadeiras e se terem lançado para a fila da frente de forma a poder receber a tinnitus em todo o seu esplendor; os norte-americanos vêm rotulados como "banda mais ruidosa de Nova Iorque", e considerando o terrorismo sónico a que os presentes foram sujeitos essa descrição não deverá ser menos do que verdade. Longas incursões noisey noite fora enquanto um baixo em groove mínimo e um baterista metronómico (desta feita humano e não máquina) impelem ao sacudir dos corpos, seja no modo hippie das meninas ou no headbang narcótico dos rapazes, perdida que está no eco a voz (não que interesse muito, neste caso). No final, as luzes desaparecem e quando damos por ela já os Bambara se juntaram à caótica festa. Dos melhores concertos que já vimos passar não só pelo Cartaxo como mesmo por Portugal: os nossos tímpanos não nos deixarão mentir durante pelo menos uma semana.

Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
04/11/2013