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Jameson Urban Routes – Romare / The Field / Octa Push
Musicbox, Lisboa
19-/10/2013


Octa Push © José Miguel Silva

Aconteceu com Octa Push, aconteceu com Romare (já lá vamos), mas nem por isso se ouviu em The Field. Axel Willner apresentou-se em Lisboa em formato trio (com bateria e órgão a juntar-se ao baixo e às electrónicas de Willner) e transpôs para palco a fórmula que lhe conhecemos bem em disco. Com Cupid’s Head ainda a ferver, a banda não conseguiu fugir à cerebralidade impositiva, a que se aliou uma aura de mistério profunda. É verdade que a obra dos suecos exige contemplação, mas acima de tudo predisposição para os jogos rítmicos – no limite do contratempo e do perceptível - e para as constantes descontruções melódicas. Excepção feita a um par de momentos em que o frio gélido da Suécia se instalou na sua música, as texturas densas acabaram por se impor e seguiram uma viagem que parecia ressoar nos ecos que ouvimos aos Cluster. Mesmo que isso tenha afastado algumas pessoas, foi o momento mais intenso da noite

Romare © José Miguel Silva

Mas se o público fugiu a The Field, depressa se juntou para adorar Romare. Sim, adorar. Ainda poucos sabiam, mas ninguém estava lá para o ver. Antes, a presença do produtor britânico implicava uma manifestação física, uma reacção imediata à pujança dos kicks e aos baixos bojudos. Romare sabe que África é o centro do mundo. Encontrou naquele continente um terminal de ritmo inesgotável e de calor musical. Por ele já passaram meses de África, dos quais partilhou amavalmente duas horas da sua visão do continente. Duas horas cheias de calor, com loas, suor, sangue e lágrimas que ambos (Romare e África) merecem.Dançou-se por amor, meditou-se sob(re) o continente-mãe e espreitou-se o futuro da música do britânico.Tanto no live-act como no dj-set surpresa que se seguiu, Romare foi sempre cauteloso na largada do kick e consequente atingir do clímax. Um espaço para respirar, que aumenta a tensão e a expectativa do que se irá passar a seguir. Entre um pad e um computador, construiu um live-act que nunca se perdia de si mesmo e voltava constantemente ao primeiro sample e à primeira batida, como que para relembrar tudo o que já passou e voltar a encontrar o caminho para casa. Um regresso à origem, sentido - tal como a despedida de Romare quando, duas horas depois de ter começado, sucumbiu ao tempo e encolheu os ombros como quem diz “dei-vos tudo o que tenho, lamento”.

The Field © José Miguel Silva

Antes de tudo isto, regressamos ao origem da noite, aos Octa Push, para relembrar cada batida, cada momento de calor, cada textura e nota desta noite. Foram reis ao agarrar o público que se dispersava pela sala e isso deve-se indubitavelmente à energia e ao companheirismo que liga o grupo. Com Oito à cabeça, ficou claro que as pistas de dança são o principal alvo dos Octa Push, seja quem for que está por lá. A música tem um pendor africano e soa fresca, contagiante e colorida – perfeito para começar a noite ou falhar miseravelmente a tentar engatar uma miúda.

António M. Silva
ant.matos.silva@gmail.com
22/10/2013