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Yo La Tengo
Aula Magna, Lisboa
1-/03/2013


Ira Kaplan pode não conhecer os Smiths, mas domina como ninguém a nobre arte daquilo a que se conveio apelidar de rock alternativo; os Yo La Tengo, senhores das guitarradas e do ruído, trio que já fez mais pela cultura norte-americana que vinte e sete Beyoncés, começaram por se apresentar despojados dessa farda. Fade: desvanecer: adeus breve à electricidade, um olá sentido à cançoneta em formato acústico. Aos primeiros acordes da bonita "Ohm" ainda nos lembramos de telefonar àquela pessoa que o requisitou, e vai-se achando piada à cover dos Snapper para que James McNew também possa cantar. "I'll Be Around" é um portento de formosidade.

© Agência Porto Company

Porquê, então, este parágrafo escrito de uma forma que dá a entender que não foi sobrenatural, como se os Yo La Tengo - valha-nos Deus, batamos três vezes na madeira, toc toc toc - tivessem sido menos que mágicos? Ah, o espaço. Só poderá ser o espaço. Uma banda rock, dizemo-lo porque é Lei, não pode ser vista ao vivo com um rabo sentado numa cadeira confortável. Porque as canções são belíssimas; mas, neste formato, igualmente sonolentas. Haja café e a propensão para a estupidez, como aquela que nos permitiu saber a informação contida na primeira frase deste texto.

© Agência Porto Company

A propensão para a estupidez que vem à tona com o arrepio causado pela alta voltagem das guitarras de Ira Kaplan, quando "Nothing To Hide" aumenta a fasquia na segunda parte do concerto (prova de que os Yo La Tengo são gigantes: na primeira parte tiveram a abrir os... Yo La Tengo). We're not a goth band, please leave the lights on! Por favor, que se acendam tanto como a Fender, que haja uma réstia de esperança, umazinha só, nesta terra que o rock esqueceu - e ela surge, nas três últimas canções do set eléctrico; a mítica cover de "Little Honda", dos Beach Boys, a ganância de uma "Ohm" que conheceu duas apresentações em dois formatos, esta noite, e uma desvairada, e posteriormente desmanchada, "Pass The Hatchet, I Think I'm Goodkind". E porque os encores são igualmente uma cena bonita, foram eles próprios duplos: primeiro com "Can't Seem To Make You Mine", dos The Seeds, em homenagem ao malogrado Sky Saxon, "Frenzy", dos The Fugs, "A Message To Pretty" dos Love (esta a pedido de um membro do público da primeira fila) e "Big Day Coming", para terminar depois com o casal La Tengo em dueto simpático e um merecido coro de aplausos. E a Aula Magna que não encheu (blasfémia) só o poderia ter feito como o fez: de pé.

Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
04/03/2013