Por causa de uma chuvada imprevista, passe o pleonasmo (premeditado), não nos foi possível contornar o efeito de um indelével atraso para o concerto da dupla Tropa Macaca no Musicbox, ao Cais do Sodré, na passada noite de sábado, 10 de Novembro. Ainda apanhámos as duas composições finais, densas, espectrais, por momentos demasiado frias, mas seria injusto alongarmo-nos mais, e taxativamente, sobre um concerto que não pudemos apreciar na íntegra. Ressalve-se, contudo, o apontamento de que o novo EP deste projecto português, intitulado
Ectoplasma (Software, 2012), com o selo da editora de Daniel Lopatin (Oneohtrix Point Never), resulta muito bem em disco. Fica para uma próxima oportunidade a comprovação, ao vivo, dessa qualidade.
Tropa Macaca © Emília Salta
Enquanto alguns assistentes reordenavam a parafernália electrónica no palco do Musicbox, Laurel Halo, a própria, conversava tranquilamente com dois amigos, junto ao bar, sobre as recentes eleições norte-americanas. Poucos minutos depois, já sem o longo sobretudo que trazia vestido, surgiu em palco (cenário soturno, dando ênfase à projecção da estrutura visual criada por Tom Scholefield, o artista multimédia por detrás do projecto Konx-om-Pax) e arrancou para um fervoroso “live act” com cerca de uma hora e meia de duração. No decurso do qual fomos remoendo a seguinte dúvida: como é que uma miúda destas é capaz de misturar tão bem?
Laurel Halo © Emília Salta
Não é sexismo, até porque há mais casos de “deejaying” de excelência no feminino: por exemplo a francesa Chloé, fundadora da Kill The DJ Records. Mas Chloé é uma veterana, senhora de uma extensa trajectória por entre as melhores pistas de dança europeias, acompanhada por pesos-pesados da cena minimal como Ivan Smagghe ou Jennifer Cardini. Ao passo que Halo é uma jovem norte-americana radicada em Brooklyn, com voz de coral e formação clássica em piano e violino, cujos primeiros registos, especialmente o EP
King Felix (Hippos In Tanks, 2010), apontavam para uma synth-pop de produção caseira, algo insípida e experimental.
Laurel Halo © Emília Salta
As aparências iludem. Camada sobre camada, por entre teclados e sintetizadores, Halo não cometeu um único erro, uma única imprecisão ao longo de um “live act” (no limiar do “DJ-set”) em que comprovou a destreza técnica que, de resto, já lhe é justamente reconhecida (não por acaso, há dias a “Fact Magazine” destacou-a na listagem “Credit To The Edit: the 15 greatest remixers working today”, a par de nomes consagrados como Theo Parrish, Carl Craig, Mark Ernestus, MJ Cole, Four Tet, Actress ou Peverelist). Sim, aquela miúda junto ao bar, de sobretudo e ténis Nike, aparência juvenil, nos antípodas do arquétipo dos grandes mestres do techno de Detroit e da house de Chicago.
Laurel Halo © Emília Salta
Como que um Frankie Knuckles de saias (neste caso, de “leggings”, à Maria Minerva, para uma sessão de ginástica rítmica), a misturar faixas de deep house que se fundem umas nas outras num fluxo contínuo, sem as disrupções que pautam muita da bass music que se produz actualmente. Com fragmentos de
Quarantine (Hyperdub, 2012) pelo meio, afinal de contas o pretexto para a segunda actuação em Portugal este ano. Halo não se cingiu à narrativa do LP de estreia, muito pelo contrário. Aliás, raras vezes enveredou pela vocalização ao vivo, mesmo que através de “loops”, optando antes por uma versão “clubbing” da sua música. Para dançar, sem as arestas sonoras e a complexidade do álbum. Defraudando as expectativas mais convencionais. Ela é uma caixinha de surpresas.