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Milhões de festa
Barcelos
20-22/07/2012


Dia Zero

Não dormi. Fosse pelo facto de ter ido ver os geniais Passos Em Volta ao Lounge na noite passada e ter chegado tarde a casa, sem que a excitação me deixasse cerrar os olhos, fosse pelo matraquear do intercidades que pouco espaço deixou a que pudesse descansar, fosse pelo cancelamento do comboio que me levaria da Campanhã a Barcelos directamente, sem passar pela "casa da cadeia" do Monópolio gigante a que chamam Nine; não dormi, mas aqui estou. Esta é Barcelos. Este é o Milhões de Festa. Estou finalmente no meu elemento. O campismo está cheio, a sombra praticamente não existe: fruto do hype? Ou será porque finalmente meio mundo não terá igualmente dormido, encarado de frente a realidade que é este é o melhor festival de música nacional? Não que alguém tenha vindo pela música. Já o disse, repito, quantas vezes forem necessárias: o ambiente em Barcelos por estas alturas é superior a qualquer concerto. Mas como esta é uma webzine sobre música e não sobre religião, falemos daquilo que, àqueles que não estão presentes, mais interessa. O rock n´ roll. Os Glockenwise, quando eu sair do McDonald's ao qual roubei sinal wi-fi, iniciarão as hostilidades no Mercado de Barcelos, num evento qualquer relacionado com a Red Bull. Não sei. Não me interessa. Vou, simplesmente, viver.

O Nuno dos Glockenwise desilude-me: canta canções sobre abandonar esta cidade. Eu não quero abandonar esta cidade. Depois de um concerto sem merdas - isto é, sem electricidade -, em que tocaram quatro canções apenas no espaço de quinze minutos (talvez tenham tocado mais, mas cheguei tarde por via do almoço pesado), mas puseram miúdas giras a dançar. Já valeu muito a pena, portanto. Enquanto os Kaïl tocam na Casa Meira, grupos alegres de jovens espancam finos no conhecido bar do Xano, porque a felicidade são um grupo imenso de bolhas a esbarrar na espuma. Daqui a pouco os Aspen vão fritar o cérebro de toda a gente. Porque às cinco e meia da tarde a cerveja ainda o não fez.

Os Aspen são três e rebentam com tudo por via do peso do riff, que é uma expressão que utilizo recorrentemente quando quero dizer que uma banda toca um rock do caralhão. Enveredando pela via do stoner e do doom, põem o largo a tremer e uns quantos mirones assustados. Os outros, os verdadeiros, adoraram com certeza. Mais logo, o recém-criado Palco Taina será local de peregrinagem para os muitos, mesmo muitos, mais do que as mães, festivaleiros. Afronta? No dia zero não é suposto haver concertos. É suposto haver cegueira. Foi precisamente essa cegueira que levou a não ter assistido a meio concerto (agora eléctrico) dos enormes Glockenwise e a ter achado os Gnod um bocado seca porque me pareceu um bocado manhoso, mas posso ter estado enganado, como quase sempre estou. No regresso, passaram-se histórias mirabolantes cujo teor não revelarei para o mundo, mas envolveram duas garrafas de gin e uma busca interminável para um bocado de gelo. Esperemos que os stoners, os punks e a miúda gira que tinha vindo ver Bro-X não leiam isto. Mas tu podes ler, Teresa: enviamos-te as fotos por mail não tarda.

Dia Um

Gostava de dizer que faz um sol do caralho, mas Barcelos acorda friorenta e sob a aura de um estranho nevoeiro. Estranho, porque é verão, e os Weedeater só tocam amanhã. Mas siga: a piscina verá abrir as hostilidades a sério, depois das brincadeiras gratuitas de ontem, e fez-se uma amiga no rosto da simpática senhora que atende ao balcão do bar do pavilhão, para já o melhor sítio em Barcelos que ninguém conhece. Chegamos então a Jibóia, projecto a solo de um mano fixe cujo nome agora não me apetece ver no Google porque não mo lembra. Noise-Dance, ou algo do género. É mesmo muito bom, mas há ainda uma ligeira ressaca a ser curada e um reservatório enorme cheio de água fresca e convidativa. Faça-se só aqui a ressalva do costume: soa a espaços a Esplendor Geométrico ou a Muslimgauze, quando cria passagens de cunho árabe na guitarra. De Jibóia para os Equations, a melhor banda de math rock nacional, foi um pulinho: apesar dos problemas de som, que persistiram um pouco por todo o concerto, os Equations tocaram um bom set e houve espaço para tudo: gritaria, crowdsurf, uma versão curtinha da malhona que é "Careless Whisper" e, imagine-se, o regresso do grande Faraday. Desta vez vestido, contudo. Já os ALTO! não precisam de ser cinco em palco. Basta serem João Pimenta, que é se calhar o tipo com mais carisma e com mais pinta em cima de um palco a tocar no Milhões. Nem me atrevo a dizer "em todo o país", que depois chamam-me ignorante e essas merdas e eu não estou com paciência apesar de ser verdade. Trinta/quarenta minutos de rock puro e banhado de sol e de soul (ah, aquele órgão, como eu adoro aquele órgão - não se riam que nem javardos, s.f.f.), canções para abanar a anca da menina e a cabeça do menino, histórias que se contam através da palavra e do riff. Se ainda não ouviram o disco, deviam. Depois de uma pausa para banhos, O Som Sistema da Lovers & Lollypops, que na verdade eram só dois e um deles edita este site por isso é melhor escrever sobre isto antes que ele me despeça, esteve em palco a passar pop e hip-hop e dance-pop muito mainstream para o meu gosto. Ou não, eram só malhões. Mas não passaram a "Friday", por isso ide para o caralho. Agora vou escrever este parágrafo enquanto espero que o Ricardo Remédio acabe o soundcheck. Talvez vá jantar um panadão.

Afinal não fui jantar. Entretanto subiram ao palco uns quantos moços que, a julgar pelo que me diz o papelinho com os horários, são os La La La Ressonance. Um deles rasga um bocadinho no saxofone: não sabia que tocavam uma espécie de free. Sinto-me tão bem com a minha t-shirt de Sun Ra neste momento. Depois passam para uma onda mais pós-rock e eu volto a ignorá-los, porque tenho o telemóvel a carregar e não quero que ninguém o roube. Já se sabe que os jornalistas são uns tesos desesperados. (Os La La La Ressonance são bons e deram um belo concerto, sem piadas). Entretanto, já me disseram que o vocalista da melhor banda da história do tímpano humano veio ao Milhões e eu soltei duas pingas. Como tudo é melhor em Barcelos, os concertos só começam quando o do outro palco terminar; posto isto, Ra sobe ao Palco Vice para descarregar um bojardão de electrónica depressiva e desoladora, apontada sobretudo à cabeça dos consideráveis metaleiros e punks que têm dado a sua benção a este festival. O concerto de hoje é, sobretudo, especial: metade será dedicada a Ra a solo e a outra aos Löbo, a outra banda de Ricardo Remédio. Esta metade já não vi. Desculpa lá, bro. É que me deixaram entrar no backstage e eu gosto de me sentir especial, porque sou um hipster sem remédio (juro que não percebi o potencial para trocadilho antes de escrever esta frase). E foi aqui que vi os Sensible Soccers - que já toda a gente devia saber que lançaram o James Rodriguez dos EPs nacionais - no palco principal, a dar show a todos os presentes, incluindo a miúda de vestido vermelho com ar de hippie que dança sempre em tudo quanto é concerto. Atmosfera pós-rock com electrónica e batida fácil de dançar: é impossível resistir a isto. Ouve-se "Fernanda", evidentemente, para que nos lembremos sempre da perda irreparável que é Gabriel Alves já não comentar futebol. Deu-me vontade de irromper por ali e tentar ser o Bez tuga, mas achei melhor não arriscar arruinar a oportunidade que me deram para ser da cena. Foi a primeira vez que os vi, e não foi menos do que perfeita...

Não será tolo pensar que a bem composta multidão que se encontra no palco principal terá vindo hoje para ver, especialmente, Baroness. Ignorante me confesso, porque antes disto só tinha ouvido o Red Album uma vez, por alto. Os Baroness são enérgicos em palco, com uma mistura de NWOBHM e progressivo que, diz-me o Zé Pedro dos Equations, se compara a Mastodon. Aceito. Verdade que a segunda malha me soa um bocado a cópia da "Time Is Running Out" dos Muse, e há momentos em que resvalam para campos glam que são, à falta de melhor palavra, azeiteiros, mas propiciam um óptimo concerto onde não faltam sessões de crowdsurfing e um sempre bonito circle pit. O disco mais recente do quarteto norte-americano, Yellow & Green, recebeu 8.5 na Pitchfork e o rótulo de Best New Music, o que quererá dizer alguma coisa. "Take My Bones Away", o primeiro single desse mesmo disco, recebeu igualmente das maiores ovações da noite. Um bom espectáculo que, provavelmente, não me vai fazer ouvir os outros discos, mas para já me colocou electricidade na ponta dos dedos: estou a escrever este parágrafo e eles ainda não pararam de tocar.

Depois de três canções de Holy Other em que a expressão correcta a utilizar é sem assunto, chega-se ao concerto dos Throes + The Shine sabendo de antemão que as falhas de Rockuduro são suplantadas ao vivo da melhor maneira: dançando. ASSIM TIPO BWÉ. Se palermas há que ficam indiferentes a esta mostra de ritmo, amor e palavras, claramente a música - caraças, claramente o Milhões - não é para eles. Depois de terem dado nas vistas em 2011 chegam a esta edição merecendo, sem dúvida, o estatuto não-oficial de cabeças de cartaz (porque supostamente os cabeças a sério seriam os Baroness) e deixam meia Barcelos de boca e braços abertos. Porque hoje é festa, milhões de festa, haverá miúdas giras convidadas ao palco para mostrar porque é que este festival é demais. Faltou nudez feminina, claro, mas aqui não se pode pedir muito mais excepto concertões. E esta coisa a que chamam rockuduro, sem merdas, diga-se de passagem, veio para ficar, porque faz mexer, porque TÁ A CUIAR, porque destrói a anca como quem sopra um dente-de-leão. O rockuduro é uma excelente ideia. E por aqui acredita-se no que podem fazer as pessoas com excelentes ideias.Já se sabe que a vida são dois dias e o Milhões são três, por isso quem possa passar apenas um dia por Barcelos tem de o aproveitar ao máximo. Assim é importante chegar cedo, para garantir um lugarzinho na relva para estender a toalha, escolher bem a vizinhança (i.e., os bikinis à volta) e não perder pitada dos concertos na piscina (sim, também há música). O segundo dia oficial de concertos arrancou com a actuação dos Gnod, que encheram o espaço da piscina com electrónica lamacenta. Funcionou como boa banda sonora para quem espalhava o protector solar, dava os primeiros mergulhos e ia buscar a primeira cerveja da tarde. Já com o público mais acordado chegaram os Revengeance: estamos próximos do território do metal, riffs acelerados onde uma voz gutural masculina entra em choque com um voz feminina punk/riot (bom sonoro para quem mandava bombas para a piscina mais à bruta). Entrou depois a dupla Moulinex & Xinobi, os primeiros vencedores do dia, que souberam pôr o povo a dançar, não só quem se abanava em frente ao palco/tenda, mas até quem estava dentro da piscina não resistia a mexer-se ao ritmo daquela electrónica de bom gosto (num misto de dança slow-motion e hidro-ginástica). Após o "warm up" da dupla da Discotexas, Da Chick confirmou-se como o melhor momento musical da tarde na piscina. Apesar de mostrar "apenas" a sua voz por cima de material pré-gravado, a "chick" Teresa Freitas de Sousa apresentou o seu cocktail funk & soul, herdeira directa do legado de James Brown, plena de energia e vitalidade. Não faltou o hit "Cocktail", delicioso, que não perde nada ao vivo ("and yes she's pretty lovely"). A tarde de música na piscina fechou com a actuação dos Bro-X, que arrastaram consigo o seu hip-hop barreirense satírico/corrosivo/fodido. Cheios de palavrões de ordem, os temas repartiam-se entre momentos de provocação sexual (80%) e alguns momentos mais sérios de consciência social. O pico do concerto foi a interpretação do hit "Karla Puta", cantada em uníssono por aqueles que se encontravam em frente ao palco.

Entre a saída da piscina, o jantar e a chegada ao recinto principal perdemos a actuação dos Blue Pills no palco Milhões, mas chegámos ainda a tempo de ver alguns minutos dos Lüger, que encheram o palco Vice com o seu rock sujo. Além de atrasada em relação ao horário previsto, a actuação de El Perro del Mar foi vítima de uma série de constrangimentos: o espaço não seria o ideal, a banda teve um arranque titubeante (que incluiu um engano num tema e a sua repetição) e principalmente um público indiferente, que parecia lá estar apenas porque não havia mais nada a acontecer no mundo (muitos deles prefeririam estar a ver uma repetição de um Gil Vicente vs Benfica dos anos 90 na RTP Memória). Apesar da banda servir-se de alguns instrumentos tocados ao vivo, a essência da música era pré-gravada, sobre a qual se juntava a voz de Sarah Assbring. O som resultava pouco orgânico, a recepção fria do público não ajudava e consequentemente o entusiasmo da banda era inexistente, perdendo-se a beleza de canções doces como "I was a boy". Sob outras condições, como aconteceu na noite anterior no Lux em Lisboa, teria corrido tudo melhor. Bem melhor correu a actuação dos Prinzhorn Dance School no Palco Vice. Trio básico de guitarra, baixo (gaja de calções curtos) e bateria, além da voz, os PDS fazem pequenas canções incisivas à base de rock directo, sem merdas. Só o groove do baixo bastaria para deixar toda a gente a dançar. No palco Milhões Connan Mockasin encontrou um público mais caloroso que a banda antecessora. O projecto vindo da Nova Zelândia levou a suas guitarras espaciais, estratosféricas, que ficaram a meio caminho entre uma sensibilidade pop e uma veia altamente trippy. Pelo meio chamaram um elemento do público para tocar teclado, durante uns segundos, curiosamente um dos grandes do meio jornalístico-crítico-etc. (o Filipe Mateus Pedro, da Fest & etc.). O concerto, muito aplaudido, terminou com uma apropriada jam, '70s style. Nuno Catarino

Os Gala Drop bem que precisavam de me animar, depois de ter feito muito provavelmente a pior entrevista da minha vida e de me ter humilhado publicamente repetidas vezes perante suecas chorosas. Mostraram no palco Vice porque é que são das melhores bandas portuguesas da actualidade: uma bateria motorik e melodias electrónicas psicadélicas, com o intuito de transportar a bem composta multidão para outros planos de percepção e preparada para o transe que se seguiria, que seria mais por via do peso e não da dança. Os portugueses deram um óptimo concerto antes de subirem ao principal os Weedeater, que eram porventura a segunda banda mais desejada pelos festivaleiros, segundo sondagens à boca das tendas em momentos matutinos de cegueira. O riff aqui arrasta-se, o cheiro a marroquina é mais do que muito e o diabo está omnipresente nas mãos que se erguem em sinal de aprovação; os norte-americanos fizeram por merecer o estatuto de cabeças de cartaz e os fãs do metal não terão por que se queixar. Porém, as maiores surpresas estavam reservadas - como o parecem estar sempre neste festival - para o palco secundário. Os Ghunagangh vieram do Porto para uma sessão de hip-hop fodido, se bem que o corpo já não aguentasse a seguir aos Bro-X; Publicist, o tal concerto-que-vai-ser-tocado-no-meio-do-público-e-toda-a-gente-vai-achar-do-caralho-só-por-causa-disso, apresentou-nos um baterista fã de deep house o suficiente para espalhar ritmo pelo público, fazendo-o no meio do mesmo, o que foi do caralho; xxxy deu-nos o melhor set da noite, alternando entre dubstep, house e Funky não faltando a enorme canção que vai pelo nome de "Push The Feeling On". Os Sabre teriam gostado de cá vir. Paulo CecílioAgora que o Catarino bazou e deixou aqui, enquanto reportagem, um monte de tanga extraordinariamente bem escrita e informativa que só interessa a quem vai ao Milhões pela música, ou seja, absolutamente ninguém, chegou a hora de voltar a armar a puta e descrever este terceiro dia da forma mais adolescente e desconexa possível. Ou, o que é pior, deixar momentaneamente o fino de lado visto ter de ver, minimamente, concertos. No entanto, já que os primeiros se deram, claro está, na piscina, concentremos-nos exclusivamente nesta e ignoremos as actuações (que foi o que fiz) para dar uns mergulhos na água (que foi o que fiz) e possivelmente papar miúdas giras (que foi o que não fiz, contrariamente ao que possam pensar pessoas ligadas à Popstock e à Time Out). Abriram as hostilidades com Grup Ses Beats, que se limitou a colocar músicas árabes ou turcas ou indianas ou algo do género tudo muito étnico e lindo parecia Sines e que deixou umas quantas a dançar alegremente dentro d'água apesar de ser música bastante inconsequente - mas, concedo, que soube bastante bem num dia quente de verão. Já Naytronix foi inconsequente e sonolento, apesar de ser constituído por dois membros dos óptimos Tune-Yards e a própria Merrill Garbus ter aparecido de surpresa para tocar guitarra. O adeus à mais famosa piscina do país e quiçá do mundo valeu sobretudo pelos Moon Duo e pela descarga de fuzz e ritmo com que o casalinho blues psicadélico apadrinhou os piscineiros, que hão-de ter saído não só com as costas mas também com os ouvidos a arder. Um dia depois de terem actuado no Musicbox, os norte-americanos não fizeram por menos e evocaram tanto os Suicide como os Spacemen 3 numa actuação que não terá deixado ninguém indiferente, até porque o volume - alto, como se queria e quer - o impossibilitava.

E agora os concertos a sério: primeiro pela mão de Al-Madar, que trouxe ao recinto outra dose de mil e uma noites para um concerto agradável que teve como atento espectador Adolfo Luxúria Canibal (o maior do mundo, portanto), e de seguida L'Enfance Rouge, que fez o mesmo, embora numa toada mais rock e magrebina e francesa - algo do género - mas que não pude acompanhar por estar com fome e o porco no espeto ser convidativo, mas não há problema, porque depois encontrei-os no backstage e pedi-lhes desculpa. Os Memória de Peixe subiriam depois ao Palco Vice para apresentar as canções do seu primeiro disco, e parece que é preciso dizê-lo sempre: as canções deste homónimo são construídas à base de loops e de improvisação. O resultado? Bem, o resultado é bastante bom: uma espécie de pós-rock dançável onde o maior hit é "Estrela Morena", malha apunkalhada para soltar a franga, não esquecendo "Indie Anna Jones" e "Fish & Chick", que contaram, respectivamente, com a participação especial de um Best Youth e de uma Chick, a Santigold da Brandoa, segundo ouvi dizer. Também houve pedidos para que se tocasse Smiths, mas estes, infelizmente, não foram correspondidos. Tenho porém de o dizer: os Memória de Peixe funcionam melhor em espaços fechados. Num cenário tão vasto, parece que algo no som se perde, como se as melodias se perdessem no vácuo; mas como isto não é uma reportagem séria, esqueçam tudo isto. Muita era a expectativa para ver, seguidamente, os Alt-J, mas os ingleses esbarraram um pouco na porta do hype; An Awesome Wave é muito bom, mas escusa de ser quase como que fotocopiado em actuações ao vivo. Concerto bastante curto (meia hora?) em que se ouviram, entre outras, "Tesselatte" e "Breezeblocks". Um concerto que se resume com um longo e duradouro bocejo. Os Red Fang seguir-se-iam com uma bojarda categórica de metal pesado, eles que eram claramente uma das bandas com maior número de fãs aqui dentro, tendo acordado, pela força do riff, tudo quanto estava adormecido devido aos Alt-J.

Os Black Bombaim juntamente com os ex-chatos dos Gnod deram um concerto tão do caralho que nem tenho palavras para o descrever e vou limitar-me a separá-lo noutro parágrafo.

Para acabar a última noite em estado de completa euforia seria necessário juntar amigos, não-amigos e potenciais amigos, bem como a quantidade certa de alcoolizados e stalkers; daí que a cegueira tenha permitido, entre outros estranhos momentos, adorar o espectáculo proporcionado pela Discotexas Band, porque remixes de Cramps é sempre amor. Cocktail de house, disco e funk, esta espécie de supergrupo levou uma multidão imensa ao palco secundário que nem por um minuto abandonou a dança. Multidão essa que foi esvaziando o recinto durante a actuação dos Shangaan Electro, que serão daquelas coisas que uns terão amado e outros odiado: eu odiei. Não soa a mais que um pastiche de poliritmos e não parece mais, em palco, que uma actuação circense. Mas, hey, eu sou branco e odeio dançar, normal que tenha detestado. Os Zombies For Money fechariam o Milhões 2013 mas eu não vi por ter tido outras coisas em mãos, mas creio que, pelo ruído, nada de valor se perdeu. Mas equivoco-me: na verdade coube ao gigante Homem Fino fechar o Milhões 2013 com uma actuação surpresa em cima de um dos barracões do backstage. Do sítio onde eu estava não o ouvia, mas espero que tenha tocado os êxitos todos.

Dia Quatro

Acontece mal os seguranças forçam o abandonar do recinto: da euforia à depressão em três curtos passos. O Milhões de Festa acaba, as tendas têm de ser arrumadas, despedidas têm de ser feitas, trolls têm de ser trollados uma última vez. Durante um ano vaguearemos por outros festivais sonhando com o que estará para vir, remexendo nas memórias do passado para que não doa tanto (mas dói: sempre). Se o pudéssemos transformar numa canção...

A felicidade do pobre parece
A grande ilusão do Milhões
Porque nós trabalhamos
O ano inteiro
Por um momento de alegria
Beber mojitos na piscina
Ouvir música até o sol raiar
Ou apanhar uma cegante bebedeira
Para tudo se acabar segunda-feira

Tristeza não tem fim
Milhões de Festa sim

Paulo Cecílio e Nuno Catarino