bodyspace.net


Nas & Damian Marley
Pavilhão Atlântico, Lisboa
14/04/2011


Prólogo: este concerto merecia outra sala, com melhor acústica e mais carisma. O Pavilhâo Atlântico, mesmo cortado pela metade, apresentava bancadas bastante despidas e nem sempre se ouviram os instrumentos nas melhores condições. A noite abre com Richie Campbell (rosto recente do reggae/dancehall nacional, que termina a actuação com “911”, tema gravado com Kymani Marley) e Orelha Negra. Os autores dum dos melhores álbuns portugueses do ano passado para o Bodyspace abrem com “Since You’ve Been Gone”. Orlando Santos não está presente fisicamente, mas a sua voz enche a sala de nostalgia. A banda dos 5 Magníficos está cada vez melhor ao vivo, introduzindo nuances que dão um refresh ao registo de estúdio, que lhe serve apenas de ponto de partida para excursões sonoras.

Quando os protagonistas maiores da noite entram em palco, já as águas atlânticas estão aquecidas pelo dj set que passa em revista alguns nomes históricos do hip hop, como 2Pac, Notorious B.I.G. ou Wu-Tang Clan. Quando o dj pergunta «Does anybody smoke weeeeed?» ouve-se o primeiro grande bruaahhh – e, de facto, o aroma circundante confirma a resposta. O fogo continua bem aceso nas duas horas seguintes, com o cocktail explosivo dos parentes afastados a ser detonado por “As We Enter” (malha fortíssima de quem não se limita a tocar à campainha, arrombando a porta ao pontapé) e “Nah Mean”, numa cavalgada pautada pelo refrão. A bandeira do movimento rastafari não pára de ser agitada, e no palco vão-se intercalando temas cantados em conjunto ou a solo, ora por Nas ("Hate Me Now" ou "Got Yourself a Gun" e "Hip Hop Is Dead") quer por Damian Marley – “More Justice” ou o já clássico “Welcome To Jamrock”. O sangue que lhe corre nas veias não engana, e Jr. Gong faz avançar a herança do Rei do reggae no Século XXI.

Em pano de fundo, atrás do palco, os rostos dos dois artistas em versão XL, com o recorte de África a fazer a ponte entre ambos. E as preocupações sobre o destino do berço da humanidade estão bem presentes em muitos dos temas partilhados pelos dois músicos (recorde-se que o álbum que suporta esta digressão teve como premissa angariar fundos para escolas do continente mais pobre do mundo), como em “Count My Blessings” ou “Land of Promise” – o sabor funky daquela opõe-se ao groove pesadão da segunda. Como uma peregrinação que custa cumprir, cheia de obstáculos a transpor para chegar ao destino negado. Há mais hip hop e reggae, incluindo versões de Bob Marley – primeiro uma dobradinha, com “War” e “No More Trouble”, e “Could You Be Loved?” para encerrar o serão em clima de festa. No próximo dia 11 de Maio passam 30 anos sobre a morte de Robert Nesta, e o seu espírito, simultaneamente revolucionário e unificador, foi sentido por todos.

Hugo Rocha Pereira
hrochapereira@bodyspace.net
16/04/2011