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Taylor McFerrin
Clube Ferroviário, Lisboa
1/04/2011


Descrever este concerto sem começar pelos problemas informáticos que desafiaram o espírito desenrasca de Taylor McFerrin seria como falar do 1º de Abril sem referir o volume anormal de mentiras que circulam nesta data.

Na verdade, o que sucedeu neste concerto poderia juntar-se à série de argumentos normalmente utilizados pelos detractores dos Mac. O computador é um instrumento tão importante para Taylor McFerrin como a sua voz ou o teclado e o sintetizador com que partilha o palco. Como o produto da Apple decidiu não cooperar durante uma boa meia hora, o músico viu-se obrigado a recorrer a outros recursos para dar música a quem estava na sala TGV. E fê-lo sempre com bom humor e espírito de missão, não deixando que a falha tecnológica fizesse implodir o espectáculo. Enquanto o staff procurava resolver o problema, lançou-se em exercícios de beatbox, com ou sem vocalizações ou teclado à mistura, mostrando squillz apurados – não fosse filho de peixe-graúdo na arte de usar a voz… –, chegando a improvisar uma letra dedicada a Lisboa e aos problemas que o computador lhe estava a dar.

Quando o Mac decide cooperar, ouve-se a primeira grande ovação da noite, e o músico desabafa, com uma boa dose de alívio no rosto transpirado: «This was crazy shit!», para na sequência tocar “Everything In It’s Right Place”, dos Radiohead (que no início da semana haviam lançado The King Of Limbs), ao compasso das palmas do público. Como o talento de Taylor não se resume ao beatbox nem a demonstrações de virtuosismo, a noite prossegue com a sua visão pouco catalogável da música. Grava bases rítmicas com a voz e lança-as misturadas com o sintetizador e algumas vocalizações. Brinca com a matéria-prima, acelerando os ritmos & batidas e introduzindo-lhes novos elementos por cima, pelo que as composições – talvez seja melhor chamar-lhes improvisações, já que McFerrin não segue uma setlist – estão em constante mutação. Acaba por funcionar como um dj que mistura e cola os temas uns aos outros, dando-lhes uma nova vida em cada live act. E por vezes a sala transforma-se mesmo em clube de dança, como nos minutos em que ritmos africanos são rodeados por ecos fantasmagóricos e uma batida intensa.

Taylor McFerrin passa também pelo hip hop, demonstrando bom flow, pela soul e ritmos electrónicos, como o jungle. Sempre com um sorriso no rosto, demonstrando enorme alegria em partilhar o seu trabalho com as pessoas. “One Man Show” seria a tag principal para descrever o concerto.

Hugo Rocha Pereira
hrochapereira@bodyspace.net
03/04/2011