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IndieLisboa 2010
Maxime, Lisboa
22-30/04/2010


À medida que os anos passam o IndieLisboa – Festival Internacional de Cinema Independente vai sendo cada vez mais consolidado. Este ano o festival voltou a crescer (os números não enganam, 44.003 espectadores, mais 25,7% do que na edição do ano passado) e a qualidade manteve-se em nível alto. A única área que sofreu um claro retrocesso terá sido a secção “Indie By Night” onde, contrariando a aposta de 2009, os concertos perderam destaque, para se reforçar as festas temáticas e os dj sets. Em vez de concertos de Mariana Ricardo ou B Fachada (que por esta altura o ano passado editava o seu Pónei), viram-se dj sets e festas variadas - além do Maxime, o Lux e o MusicBox também acolheram estas festas. Mas o Maxime foi mesmo o quartel-general e a primeira noite, com dj set do auto-designado “cantor romântico abandonado” Gonçalo Gonçalves, foi especialmente concorrida e divertida. Ainda no Maxime, durante três dias foi recriada uma cena do clássico Blue Velvet de Lynch. A excepção aos dj sets foi a actuação ao vivo dos Irmãos Catita, que mais uma vez levaram ao palco do cabaret o seu habitual ritual kitsch-javardo (desculpe-se a repetição, mas aqui não há novidades) comandado por mestre Vieira.

Já em termos estritamente cinéfilos não houve desilusão. A programação incluiu documentários sobre correntes estéticas muito variadas, numa larga amplitude sempre elogiável. Numa sessão dupla sobre música de Angola foram exibidos os filmes Angola – Histórias da Música Popular (indo dos lendários Ngola Ritmos ou do Duo Ouro Negro ao kuduro de Sebem, passando por clássicos como a irresistível “Chofer de Praça” de Luiz Visconde) e Kuduro – Fogo no Museke (sobre a música/dança angolana que anda a incendiar o mundo, com figuras de proa da cena como Tony Amado e Dog Murras). Em seguimento a estes, foi estreado o filme O Lendário “Tio Liceu” e os Ngola Ritmos, completando-se assim a trilogia do realizador Jorge António sobre a música de Angola.

Um dos destaques deste ano foi a apresentação de uma selecção de documentários nacionais, patrocinados pelo MusicBox. Alternando excertos de entrevistas (foi bonito ver o amigo Mário Lopes no papel de actor secundário) com imagens de concertos no espaço do Cais do Sodré, foram analisados os mundos de JP Simões, Dealema, Micro Audio Waves, X-Wife e Terrakota. O lendário homem tigre Paulo Furtado teve direito a uma sessão à sua volta, que incluiu o documentário On the Road to Femina (sobre o trabalho homónimo gravado com o alter-ego Legendary Tiger Man) e ainda três curtas metragens realizadas pelo próprio Furtado. A música portuguesa teve ainda destaque em dois filmes de Tiago Pereira: Significado – A música portuguesa se gostasse dela própria (o título é quase auto-explicativo) e B Fachada – Tradição Oral Contemporânea (mais informações sobre este ali ao lado).

Do estrangeiro chegou-nos Strange Powers, óptimo documentário sobre Stephen Merritt e os Magnetic Fields, que serviu para relembrarmos a genialidade absoluta que é o primeiro cd das 69 Love Songs, tendo este filme contado com a participação de Sarah Silverman (ainda que breve) e uma deslocada polémica “racista” com Sasha Frére-Jones. A programação incluiu ainda documentários muito distintos, como All Tomorrows Parties de Jonathan Caouette, When You're Strange de Tom DiCillo (sobre os Doors, com direito a sessão especial) ou Leonard Cohen: Live at the Isle of Wight 1970. A grande decepção da secção foi Villalobos, enfadonho documentário sobre um músico que merecia uma abordagem muito mais interessante. Vale ainda a pena referir o primeiro filme exibido no festival, Greenberg de Noah Baumbach que, apesar de estar fora da secção “IndieMusic”, tem “trilha” sonora da responsabilidade dos LCD Soundsystem.

A latitude estética e estilística da selecção de filmes confirmou bem a amplitude deste festival, que ficou apenas a pecar pelo pouco destaque dado à música ao vivo. E este pecado é ainda mais notado num festival que ostenta a palavra “indie” no seu nome.

Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
07/05/2010