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Portico Quartet / Sweet Billy Pilgrim
Teatro São Luiz, Lisboa
22/03/2010


O Portico Quartet pratica jazz, mas é um jazz especial, fora do cânone. Não se baseia simplesmente nas regras clássicas, no swing e na improvisação, serve-se destes elementos mas vai mais além. A plateia bem composta do Teatro Municipal São Luiz assistiu à primeira de três actuações no regresso do quarteto londrino a Portugal (o grupo ainda vai ao espaço bracarense Pedro Remy e ao Auditório de Espinho) e comprovou de que forma estes quatro ingleses injectam modernidade no jazz tendo por base uma combinação instrumental atípica.

Além de um esquema base de trio jazz – com os saxofones tenor e soprano (Jack Wyllie), contrabaixo (Milo Fitzpatrick) e bateria (Duncan Bellamy) - o grupo conta com um raro instrumento, o “hang” (Nick Mulvey). Por um lado, este instrumento de percussão – que tem capacidade de cumprir um limitado papel harmónico, imagine-se um vibrafone submerso ou coisa assim – dá ao som do grupo uma dimensão extra. Por outro lado, a música do quarteto assenta numa estratégia muito própria: o ritmo é trabalhado de forma obsessiva, com os músicos numa espiral de repetição constante dos padrões rítmicos – as referências ao minimalismo, a Glass e a Reich não estarão completamente erradas -, desenvolvendo assim uma forte tensão, sobre a qual apenas o saxofone viaja com um pouco mais de liberdade.

Ainda assim, o saxofone nunca foge muito, mantém-se numa permanente estabilidade, e a força do grupo está aí, nessa extrema concentração, nessa capacidade de respeitar a forma. E é a partir desse obsessivo trabalho que cada composição vai depois crescendo de forma sub-reptícia, para nunca rebentar num clímax. Apesar de frequentemente colados a bandas “out-jazz” como Polar Bear ou Acoustic Ladyland, será mais justo encaminhar este Portico Quartet para outro grupo de referência de outra era, os Cinematic Orchestra – tendo em conta os épicos momentos instrumentais. Aproveite-se para relembrar que Motion é um disco intemporal e encontra aqui uma espécie de descendência – algo bastarda mas, nos melhores momentos, da mesma cepa.

Na primeira parte actuou o grupo, também inglês, Sweet Billy Pilgrim. Em contraponto com a atracção principal, esta banda de canções melancólicas, que gravou na editora de David Sylvian, faz por vezes lembrar o desespero de um Matt Elliott, ainda que outras vezes se deixe cair no caixote do indie genérico. O efeito surpresa acabou, contudo, por deixar uma boa parte da plateia entusiasmada.

Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
23/03/2010