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Ariel Pink / Deerhunter
Lux, Lisboa
01/06/2009


Depois de uma sexta-feira com o mar ligeiramente flat, a Califórnia mais “fora” não deixou de fazer ondas em Lisboa. Durante as horas mais tardias do Dia da Criança, os miúdos reunidos no Lux tiveram a prenda que mereceram: a “aparição” do incomparável Ariel Pink em formato de quinteto (também conhecido por Ariel Pink’s Haunted Graffiti). Durante uma hora, foi possível constatar como Ariel Pink é realmente a imparável jukebox humana que conhecemos dos muitos discos; o milagreiro pop capaz de multiplicar o fenómeno one-hit wonder por 666. Mesmo depois de ter conhecido alguns dissabores pessoais nos últimos anos, o pequeno grande Ariel Pink necessita do mínimo esforço para, em palco, ser o entertainer esquizofrenicamente enciclopédico que dá voz a todo o tipo de crooners e ídolos. As canções, que também não se medem aos palmos, falam por si. E muito falaram no Lux as tais canções que parecem ter sigo resgatadas às entrelinhas esquecidas dos topes Billboard.

Um concerto de Ariel Pink tem também o seu quê de sessão de espiritismo que diverte muito mais do que se esperaria. Vagueiam por ali muitos fantasmas. Sem ancorar numa temporada ou género específico, o californiano (cada vez mais parecido com o imaginário irmão mitra de Rivers Cuomo dos Weezer) guia a sua banda por um labirinto que corrompe toda a pop e rock FM, independentemente da ingenuidade e riqueza melódica que possam conter. Depois disto, há que repensar a aplicação de lo-fi / baixa fidelidade como definição para a música de Ariel Pink: no Lux, a banda provou ser perfeitamente capaz de transformar os “êxitos” decadentes em desvarios dançáveis, que abrem as pernas ao furacão psicadélico apenas quando necessário. O abuso dá a folga certa a canções que mais não são do que diamantes cobertos de merda: “Among Dreams”, “Higher and Higher” ou “Are You Gonna Look After My Boys?” (a finalizar em festa) foram apenas alguns dos golpes deste génio condenado a dividir opiniões. Sobra um desejo: Ariel Pink devia ser o artista residente numa qualquer sala de Lisboa. Pá! Quem arranja uma namorada portuguesa para este rapaz? MA

Apesar do fantástico concerto de Ariel e sus muchachos, dava para perceber pelas cabeças da plateia ao que realmente vinham. 15% de cabeças a abanar com Ariel, sendo uma delas a do próprio Bradford dos Deerhunter que divagava pela audiência. Mas aos primeiros acordes da banda de Athens, Geórgia, pelo menos 70% de cabeças começaram a abanar o capacete. E a banda começou bem, excepto um engasgo do baterista que motivou um arranque em falso e um rápido “What the fuck” do chefe Brad. Mas siga o baile e lá foram entrelaçando músicas de Microcastle e Cryptograms, com “Obrigado” e “I love Lisbon”. Pelo menos mais que Helsínquia que Bradford lá saberá, porque diz “I hate Helsinki, Helsinki buh”. Mais tarde, e após uma sequência genial de “Cryptograms”, a canção, e “Octet” do mesmo álbum, onde Bradford se libertou em guitarradas sónicas num solo cósmico, bem sustentado pelo resto da banda, no momento mais Spacemen 3 da noite, dizia, mais tarde, uma das cordas da guitarra de Bradford rebentou. Isto fez com que o já muito falador Bradford, falasse ainda mais. Primeiro mandou a banda fazer um aquecimento “country honky tonk” enquanto punha uma corda nova. Ela correspondeu num momento humorístico onde muita gente se interrogava porque razão eles não têm uma guitarra de substituição. Bradford lá respondeu sorridente que não tinham dinheiro para ela. Depois, enquanto afinava o instrumento, lá conclui que melhor que “Lisboah” só mesmo Athens, Geórgia. E no momento wikipedia da noite, muitos provavelmente foram relembrados ou ficaram a saber que além deles Deerhunter, a Atenas americana deu à luz B52’s, R.E.M, e os mais desconhecidos mas igualmente fabulosos Pylon.

Guitarra pronta e de regresso ao alto e bom som, vieram pérolas como “Dr. Glass” e “Fluorescent Grey” do EP com o mesmo nome, e antes do encore, um magnífico “Spring Hall Convert”. Palmas, muitas. Saem por uns segundos, voltam rápido. Encore magnífico com músicas do seu novo EP Rainwater Cassette Exchange – “Famous Last Words” e “Circulation”. Mais palmas. Muitas. Bradford qual animal de palco volta sozinho. Quer tocar guitarra diz. Fazer um solo. Começa a tocar uns acordes de Neil Young. Fala que Neil é cool. Desafia ao microfone Ariel Pink a vir para o palco outra vez. Ou alguém dos seus Haunted Grafitti. Demoram a aparecer, mas lá vieram três dos cinco, o guitarrista, o baterista e o baixista. Que trocam de instrumento, excepto o baterista. E é nesta banda improvisada, que Bradford lidera, “now a g-chord” vai repetindo, que surge uma fantástica e histórica versão de “Down by the river” do grande Neil Young. Bradford não sei se tinha alguma coisa a provar a alguém, mas provou ser um dotado guitarrista e animal de palco. Bye bye see you a next time. NL

Miguel Arsénio / Nuno Leal