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Youthless / John Maus
ZDB, Lisboa
29/05/2009


Sexta-feira, 29 de Maio parecia conter um dos programas mais perfeitos de sempre. Youthless-Wavves-John Maus. Mas a imperfeição surgiu. Os Wavves, que vinham directamente de Barcelona, do Primavera Sound Festival para os calores da ZDB e de Lisboa, subitamente cancelaram a sua presença. Alegavam-se problemas com a saúde de Nathan Williams, vocalista, guitarrista e alegado cérebro da banda. Desculpa verdadeira certamente, já que a saúde pelo menos mental de Nathan não estará em condições, pois em Barcelona deu um concerto miserável segundo dizem, chegando inclusive a vias de facto, ou por outras palavras andou à porrada, com o baterista em pleno palco. Diz quem viu, que depois, apesar do pessoal do backstage começar a tirar o equipamento, o tresloucado Nathan insistia em tocar, pretendendo continuar sozinho, já sem electricidade e tudo. Em bom inglês “Nervous breakdown”. Isto de fama e tournés mundiais tem muito que se diga e não é para qualquer um. Mas Nathan é novo e pode muito bem voltar em força, ficamos à espera, até porque os Wavves já presentearam o mundo com dois discos muito bons. Como nota de curiosidade, no myspace dele(s) desapareram todas as datas europeias permanecendo apenas dois concertos em Julho lá nos States. Have a nice detox Nathan!

Mas tudo bem. “No” Wavves, mas OK com Youthless e John Maus. Que não desiludiram nada. Que surpreenderam muito. Eram 23 e tal, e lá entram Sebastiano Ferranti e Alex Klimovitsky, os dois Youthless. Um inglês e um norte-americano que anda pelos ares de Lisboa há algum tempo, senhores de um power duo munido de bateria e baixo sobre sons processados e voz com vocoder. E a Zé dos Bois bastante preenchida de gente rendeu-se aos ritmos dançáveis e mutantes do duo. Uma mistura de sonoridades rock mais “dancefloor friendly”, leia-se Klaxons, Bloc Party ou Rapture, com momentos mais Material, Gang of Four. Nota máxima para o vocalista-baterista e homem do Yoga que ao leme de uma bateria perde toda a calma do mundo e perde-se em ritmos Keith Mooníacos. E no meio desta agradável surpresa, a mais engraçada de todas. “Já que os Wavves não vêm, e vocês vieram ver os Wavves, vamos tocar uma dos Wavves...”. Um hino de uma geração séc. XXI que anda por aí, “So Bored!”. E o público rendeu-se mais uma vez, apesar dos desafinos, e da versão com menos feedback. Mas se calhar, assim à primeira, melhor do que o “So bored!” em Barcelona. Bravo.

Intervalinho, e eis John Maus. O antigo teclista dos Haunted Grafitti de Ariel Pink, começou com o poder todo. Loiro de camisinha betinha, com ar de aluno de Harvard, sai do palco, entra pelo público adentro e lança um grito de ordem que se prolonga e repete por minutos, de braço estendido no ar, um “Grrrrrrr” de "esqueçam lá os Wavves". A partir daqui, mais de uma hora inspirada e extremamente suada do norte-americano. Pop esquizofrénica de calibre superior, R. Stevie Moore em ritmos new wave de oitentas descontruídos com uma wall-of-sound de transístor ferido, os dias da rádio com os Associates, Gary Numan, Tuxedo Moon, Yellow Magic Orchestra, Ian Curtis, Nick Cave, Iggy Pop e David Bowie. Uma torrente inesgotável de músicas dos seus dois discos i> Songs e i> Love is Real , com o auge em "Time to Die", “Pure Rockets” e “Do Your Best”, a tal do “... in the city tonight...” gritado a plenos pulmões pela audiência. Um universo estranhíssimo por momentos longe da solidão como se fosse um concerto do mais mainstream. Por momentos a utopia feita realidade ali na salinha da ZDB com gente atónita na rua do Bairro Alto a espreitar do lado de fora.
Como qualquer grande concerto, houve direito a encore, onde depois as coisas acalmaram um pouco, qual voo excêntrico a caminho da aterragem, de um one man show que pôs toda a gente a dançar à St. Vitus. Sim porque música destas, só se dança como um maluco. E assim o fim foi bem mais “dark”, numa espécie de Soft Cell comido pelo reverb. Mas também toda a gente, pelo menos uma metade mais resistente, também já estava comida pelo suor. Depois foi “... reach out your hands to the one’s alone, in the city tonight...”.

Nuno Leal
nunleal@gmail.com
01/06/2009