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Cansei de Ser Sexy / Tilly and the Wall
Lux, Lisboa
03/04/2007


O apelo das CSS obedece a um timing exacto que as internacionalizou a partir de São Paulo e que, eventualmente, as devolverá à cidade quando chegar a hora do fenómeno se evaporar. Deixará, contudo, denso rasto o fenómeno que alguns já perfilaram como a banda sul-americana com maiores probabilidades de alcançar a dimensão dos Sex Pistols. Tão denso quanto revelador da maturidade adquirida por força de um incessante calendário de concertos. Esse que rendeu ao palco do Lux umas Cansei de Ser Sexy em pico de forma, mas nem por isso capazes de exceder as enormes expectativas que se acercam de uma banda que, de um dia para o outro, passa de capricho local a integrante do reputado catálogo da Sub Pop.

Esperava-se da banda inteligentemente calibrada por Adriano Cintra que provocasse o nirvana colectivo ao tomar de assalto o Lux, e foram várias as ocasiões em que o êxtase esteve ao rubro dos dois lados da barricada: “This month, day 10” conheceu uma coreografia aeróbica-havaiana, “Meeting Paris Hilton” inundou a sala de “yeah yeah yeah’s” de odor a pastilha elástica, a satírica e ácida “Art Bitch” agiganta-se ao ponto de soar a revolução de favela e faz recuar Carolina da guitarra até à bateria que vinha a ocupar o pulmão Adriano Cintra. A perfeição mecanizada da produção que em disco é implacavelmente viciosa é sacrificada em prol de uma mais despreocupada e natural atitude punk pontuada pelos erros que só contribuem para o seu charme. Lovefoxxx multiplica-se em manobras corporais e talentos que a confirmam como o ídolo sexual perfeito para a geração das comunidades cibernautas em que as amizades se agrupam em cadeia. Em jeito de homenagem, esboçaram-se covers de L7 – será premonitório adaptar a óbvia “Pretend We’re Dead” – e Sleater Kinney – “I Wanna Be Your Joey Ramone” é adaptado à muito mais curvilínea e sexy (?) “I Wanna Be Your J-Lo”. Faltou alguém para chamar um doutor que diagnosticasse a ambos os momentos a sensação flagrante de que foram meramente acessórios.

Voltamos circularmente ao mote desta breve crónica: o timing é um bem precioso no caso das CSS e o que há uns anos era febre em Roterdão é história arquivada na mais actualizada São Paulo fashionista, que em tempos delirava com as suas precoces progénitas. A capacidade de apaixonar que possa ter surtido o muito competente espectáculo cumprido pelas CSS no Lux depende essencialmente da proximidade mantida por cada um perante um disco tão eminentemente contagiante quanto o homónimo CSS. Pode até ser lançado na mesa do cepticismo o argumento que aponta a banda de Lovefoxxx como capaz de incendiar em festa um espaço até aí entediado, mas tal aptidão é o mínimo que se exige a seis brasileiros em movimento sobre a mesma superfície. Um concerto de CSS diverte abundantemente, mas esgota em uma hora todas as possibilidades, tratando assim de não deixar sobrar quaisquer outras por revelar numa segunda ocasião.

Antes de São Paulo se teletransportar até à beira do Tejo, houve tempo para testemunhar a absurda inconsequência que protagonizaram uns Tilly and the Wall que podem até ser protegidos de Conor “Bright Eyes” Oberst, mas que exigem cinco vezes mais paciência que as faixas mais dispensáveis conhecidas aos discos do prodígio de Omaha. Em traços gerais, duas loiras platinadas emulam as Dixie Chicks de um modo mais folião, enquanto uma morena, com um físico de porte de atleta de natação sincronizada, tenta assumir as rédeas rítmicas da coisa com os sons do seu sapateado algures entre o flamenco primário e o circense. Mereceram aplausos simpáticos e a atenção imperturbável de um técnico que observava o concerto a partir de perspectiva privilegiada.

Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
03/04/2007