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Comets On Fire / CAVEIRA
Porto Rio, Porto
14/10/2006


Há uma guitarra presa num cabo junto ao tecto do convés do Barco Gandufe; há cabos danificados, uma cabeça de amplificador quase a cair, joelhos no chão. Eis o vendaval Ben Chasny, revelado na recta final do segundo concerto dos Comets On Fire em Portugal. Foi o lado mais anárquico de uns Comets cada vez mais rendidos às formas do rock clássico (mais Fleetwood Mac, menos MC5 e Hawkwind). Com Avatar ainda fresco, vieram incendiar o Porto Rio e dar uma lição de rock clássico sem ser copião.

Ethan Miller e Chasny mostraram ser uma dupla de guitarras notável, com diálogos intuitivos que demonstram um conhecimento amplo do manual do rock clássico (dos Allman Brothers aos Quicksilver Messenger Service). Noel von Harmonson destruía saudavelmente no echoplex (equipamento analógico para produzir ecos) o que os companheiros montam, acrescentando mais ares cósmicos à música. Comets On Fire 2006: súmula de boa parte da música rock mais intensa dos últimos 50 anos.

“Dogwood rust”, o tema inaugural de Avatar, abriu as hostilidades com guitarras aos círculos, Ben Chasny a desfiar um solo magnífico e a bateria de Utrillo Kushner a fazer uma dupla propulsora com o baixo. A voz de Miller não esteve sempre perfeita como em Avatar, mas perdova-se dada a intensidade over the top de todo o concerto.

Ainda de Avatar, “Jaybird” confirmou a sua força épica, alternando entre o sexy e o poderoso - as escaladas de guitarra a 240 quilómetros por hora deixaram marcas (foi ver Chasny a mexer-se como um gato escaldado, Miller aos berros como se os anos 70 fossem hoje). De Blue Cathedral (o segundo prato forte da noite), visitaram pérolas psicadélicas como “The bee and the cracking egg” e “Whiskey river” (impressionante a passagem da guitarra límpida introdutória ao rodopio eléctrico do resto do tema).

É curioso que tenham sido os CAVEIRA a dar o pontapé de saída na noite Comets. Logo em África (CD-R de estreia de uma banda que vive mais dos palcos do que audições confortáveis no lar), o trio lisboeta mostrava ser uma espécie de Comets On Fire em pedacinhos - também passam por aqui os Hawkwind e o rock mais stoner, mas as referências são logo pisadas e repisadas pela fúria improvisada das guitarras de Pedro Gomes e Rita Vozone e da bateria de Joaquim Albergaria.

A banda tem uma particular ideia de improvisação: não é descaradamente noise nem abstracta porque bebe dos blues e do rock (a escala pentatónica é a base de boa parte das três peças que fizeram, facilitando a comunicação entre Gomes e Vozone); não é uma jam blues porque os riffs são poluídos pelo feedback. Os Black Sabbath e mesmo o punk vivem por baixo da casca de ruído que os CAVEIRA tão bem produzem. Foram um excelente bálsamo para o festim rock’n’roll despudorado que se seguiria.

Pedro Rios
pedrosantosrios@gmail.com
14/10/2006