Quem se deslocou ao Porto Rio, segunda-feira, para ver os Liars não terá tido a surpresa dos que há três anos os viram no Teatro Sá da Bandeira. Nesse estranhíssimo concerto, os ex-punk funkers, até lá cultores da nostalgia dos Gang of Four e ESG, anunciavam a transfiguração que They Were Wrong, So We Drowned (2004) consubstanciaria. Desde então, os Liars ainda colhem referências sonoras e metódicas do pós-punk (menos dançável, mais desconstrutivo), mas de forma menos seguidista. No processo, perdeu-se o apelo directo e sexy do primeiro disco, mas surgiram uns Liars mais personalizados.
Os “novos” Liars são simultaneamente mais aborrecidos e mais excitantes do que os anteriores. O trio visitou vários momentos de Drum’s Not Dead e They Were Wrong, So We Drowned e algumas novidades. O início do concerto não foi particularmente feliz: na sua indulgência, os Liars não foram além de peças a transpirar desconexão, com a voz de Angus Andrew extremamente alta, nos limites do suportável.
As coisas acabaram por melhorar mas o trio andou sempre entre o ruído preguiçoso e vendavais catárticos. Angus, de indumentária industrial, arranhava a guitarra, emissor de som bruto logo transfigurado; Aaron Hemphill alternava entre a guitarra, com um discurso mais sólido e reconhecível do que o do colega, e a percussão, entrando em despiques com Julian Gross, o aluado baterista trajado de seda (que raio fazia ali um Rato Mickey?).
A dada altura, dá-se o desabrochar de Angus: o vocalista despe o fato-macaco e revela um vestido vermelho, a revelar as cuecas brancas. Instalado o circo, pareceu que a música seguiu a mesma direcção: o ritmo acelerou, sentiu-se mais a força contagiante da percussão, elemento central na nova estética Liars, e a banda entrou em trocas de carinhos com o público. Feitas as contas, ficou um bom concerto e a certeza que os Liars são uma banda a ter em conta no rock independente actual.
Na primeira parte, os Deerhunter deram bons sinais, apesar da fraca qualidade de som. Eis um som válido sem que traga algo de novo: a voz passada por delay evoca Animal Collective (sem a pureza genial dos autores de Feels); as guitarras remetem para os anos dourados do indie rock, o baixo e a bateria são a força propulsora de tudo o resto, seguindo padrões hipnóticos repetitivos. Apesar de alguns temas mais colados a uma ou outra referência e de nunca ultrapassarem a mediania, conseguiram não ser totalmente ofuscados pelos cabeças-de-cartaz.