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Zezo Ribeiro & Olmir Stoker "Alemão"
Café Central, Madrid
22/09/2006


Em 1982 um grupo de amigos reuniu-se e ‘ocupou’ o número 10 da Plaza del Angel e deste então o Café Central tornou-se numa das salas mais importantes de jazz em Madrid – em 1991 a Wire colocou o Café Central de Madrid no oitavo lugar dos melhores clubes de jazz europeus. Em 2006, olhando para trás são já 24 anos de concertos com uma particularidade: quem passa pelo Café Central fica sempre pelo menos uma semana em cena, uma opção que visa privilegiar a música (que assim pode crescer ao longo dos dias e estar acima dos problemas técnicos ou azares de um dia mau) e para o público, que assim pode escolher o dia da semana para assistir aos concertos. Independentemente da música, durante toda a semana, o Café Central é um local de passagem obrigatória pelo seu ambiente intimista e pelos menus culinários.

Desta vez, no cartaz que anuncia os concertos da cena podia-se ver os nomes de Zezo Ribeiro e Olmir Stoker “Alemão” e uma adenda: “2 grandes da guitarra do Brasil”. Período de residência: 18 a 24 de Setembro. Zezo Ribeiro é um guitarrista de São Paulo que viveu em Madrid durante bastantes anos; Olmir Stoker “Alemão”, o maestro de Zezo Ribeiro, é considerado como um dos grandes guitarristas de jazz do Brasil, fez parte dos Brazilian Octopus, chegou a tocar com Elis Regina. Tocam juntos há 25 anos - Zezo Ribeiro confessava que o reencontro com o seu mestre era algo de muito importante para si.

O encontro entre os dois combina o jazz de Olmir Stoker “Alemão” (de guitarra eléctrica na mão, som ‘abafado’, subtil), algum flamengo das mãos da guitarra acústica de Zezo Ribeiro (que veio para a Madrid aprender flamenco há bastantes anos com o apoio de um órgão cultural brasileiro que lhe ofereceu uma espécie de estágio em Espanha) e algo que os une por razões óbvias: a música brasileira, a bossa nova, Antonio Carlos Jobim. Quer nos momentos mais guiados pelo ritmo, quer nos momentos mais taciturnos, a fusão foi-se sempre motivo de interesse, ainda para mais quando o entendimento entre ambos se mostrou imaculado.

Quando Zezo Ribeiro se dirigiu ao público, num espanhol perfeitamente à vontade, fê-lo para contar a história da sua vinda a Madrid: Zezo conheceu o seu professor cigano (de flamenco) que nas primeiras três apenas lhe ensinou frases enigmáticas de difícil entendimento. Zezo Ribeiro confessou que agora faz o mesmo com os seus alunos do Brasil. A única vez que Olmir Stoker “Alemão” foi para contar um “chiste” (uma anedota), sobre o músico de jazz americano que quando se viu confrontado com a situação de ter Hitler, Mussolini e Kenny G na sala da Prisão e apenas duas balas na pistola optou por matar primeiro Kenny G e depois o seu saxofone para que os dois ditadores restantes não tivessem a oportunidade de o tocar.

No que à música diz respeito, por entre os standards, destacaram-se “Triste” e “Wave” de António Carlos Jobim. Mas impressionou igualmente algumas das composições originais de Olmir Stoker “Alemão”, sempre irrepreensível na guitarra eléctrica com Zezo Ribeiro mesmo ali ao lado (igualmente infalível na guitarra acústica, de som limpo e puro). Mais de duas horas de concerto com uma pausa após a primeira hora e com um tema extra em encore, o primeiro da semana confessou Zezo Ribeiro. A sala, essa, estava cheia, local que muitos escolheram em Madrid na noite de sábado para fazer uma pequena viagem até ao Brasil.

André Gomes
andregomes@bodyspace.net
22/09/2006