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Adam Gnade partilha com o Bodyspace considerações acerca das 10 preferências que mais estima



A morada exacta de Adam Gnade é tão incerta como a direcção que tomam as suas preferências numa lista de 10 coisas predilectas que partilhou com o Bodyspace. Ele que tem vindo a acompanhar os Castanets em digressão, vive numa deriva reminiscente dos poetas beat, mas vai arranjando tempo para escrever prosa vária (o seu primeiro livro será lançado em breve) e curtas e esclarecedoras biografias de artistas vinculados à Asthmatic Kitty e outros tantos. Num âmbito mais musical, vai cedendo o seu estilo vocal falante a vários colectivos folk norte-americanos que conhecem bem os solavancos que implicam atravessar regularmente o país de costa a costa. Antes de partir para Inglaterra, onde viria a cumprir uma curta digressão, Adam Gnade arranjou tempo para elaborar uma lista das suas principais preferências.

Dez coisas fabulosas
por Adam Gnade

© Rob Queenin

1 Sopa chinesa picante e agridoce
Onde vivo actualmente em Oregon, dominam os tons cinzentos e escuros, e a maior parte dos dias começam com sopros ventosos e terminam com chuva. São dias de difícil assimilação se as resistências emocionais estiverem demasiado susceptíveis. Todo o tipo de gente desenvolve métodos de preempção para contrariar a Desordem Própria da Época, que pode ser uma real chatice. Quer isso passe por ficar em casa a fazer arte ou consumir uma tonelada de cocaína – toda a gente tem a sua cura para tudo, e a minha é a Sopa chinesa picante e agridoce. Ajuda-te a acordar, desimpede os canais respiratórios, e põe-te em forma, independentemente do recanto obscuro de onde provéns. Compro a minha no Restaurante Vegetariano Bayleaf, mesmo por baixo de onde moro em Division Street. É preparada de modo totalmente vegan e servida em grandes porções em taças de barro.

2 Blues antigos
Quando comecei a desenvolver o género que costumo apelidar de talking songs, estudei uma grande quantidade de blues do Texas e Delta e defini a voz que procurava para mim mesmo a partir dos cantores de blues mais sonantes, intensos e fixos à fala. É costume categorizarem a minha música como spoken word, mas eu sempre odiei esse género. Prefiro pensar no meu material como uma deconstrução de músicas como “Talking Dust Bowl Blues” de Woody Guthrie ou “Talking Union” de Pete Seeger. Começam como canções folk e evoluem até uma forma volumosa, elaborada e mais rock – e, por vezes, vice versa.

3 A minha guitarra

Não aprecio o som de uma guitarra acústica tradicional – são prateadas e emitem demasiados tinidos e ressonâncias. A minha guitarra acústica – a única que toco ao vivo ou em disco – é uma baratinha Ovation Applause com o cavalete muito em baixo e sem a sexta corda. Produz um som seco e simples – como se tivesse sido feito a partir de uma caixa de charutos.

4 Rob Tyler
Rob Tyler é um artista visual de Portland que transforma as suas pinturas em filmes de animação que te fazem perder a cabeça. O seu mais recente filme, Color + Modulation, combina círculos concêntricos de cores que florescem com a música em sombreados vibrantes que existem apenas em flores e frutos durante o pôr do sol. Quando gravo por mim só, passo o Color + Modulation sem o som e assim fica o dia inteiro, até ser a única fonte de luz quando o sol se põe e a minha sala começa a ficar escura.

5 Bandas:
Ohioan, Peter and the Wolf, Vetiver, Inca Ore, Viking Moses. O meu amigo Ryne toca na banda Ohioan, verdadeira banda folk sempre presente nas estradas Americanas. Gravámos um split juntos e ele impressionou toda a gente na festa de lançamento ao tocar com membros dos Shaky Hands e Castanets. O meu amigo Red toca com o nome de Peter and the Wolf. O seu novo disco chama-se Lightness e “Safe Travels” é a música de estrada que eu gostava de ter escrito. Vetiver... Já ouviste o novo disco? (To Find Me Gone) Demasiado bom. Inca Ore é Eva Saelens. A Eva tocou com os Gang Wizard (com quem gravei um split lançado pela DeathBombArc), Jackie-O Motherfucker, e os Yellow Swans, mas Inca Ore é o seu projecto de noise a solo e é desarmantemente bom e original. Ela é também uma escritora fantástica, que escreve sobre viver em quintas de plantação de erva, andar à boleia e como se vive fora do mainstream. Espera só até os seus livros começarem a ser lançados. Viking Moses... Adoro a música do Brendon. Terei a oportunidade de tocar com ele em Inglaterra em Novembro.

© Rob Queenin

6 Vinho tinto, frutos silvestres, manteiga de caju e bananas.
Não sei viver sem eles.

7 Gin Bombay Saffire

Adoro-o, mas torna-me violento. Toquei com os Castanets e Kingdom há uns meses atrás e acabei por sair para lutar contra uma árvore.

8 Jessie Duquette e Jesse Von Doom

Ambas estão encarregadas de lançar o meu primeiro livro Hymn California este Inverno na DutchMoney Publishing. Não podia ter trabalhado com uma dupla melhor que esta. Tenho sido suficientemente sortudo ao ponto de, neste último ano em que comecei a escrever profissionalmente, contar com um monte de pessoas que se dispuseram a aceitar-me, a pagar o que me é merecido, tratar dos meus negócios e evitar que eu pareça estúpido.

9 Han-Shan
Han-Shan (também conhecido por Cold Mountain) era um monge budista na China do século VII. Viveu como um fugitivo debaixo de uma gigantesco afloramento rochoso e inscrevia, em pedra e árvores, poemas sobre a sua vida, política Chinesa e Budismo. Quando desapareceu (dizem que ao cair num abismo que, por magia, o absorveu), os seus poemas foram guardados e, mais tarde, traduzidos para inglês. Devo dizer que raramente leio poesia e nem sequer a escrevo (as minha canções surgem da prosa), mas a que deixou Cold Mountain é muito diferente de tudo o resto. Gostava de o ter conhecido.

10 Rob Queenin

O meu amigo Rob Queenin é um magnifico fotógrafo. Estou prestes a partir para uma digressão em Inglaterra (ou estava, no início de Novembro) e ele ligou para – sem que nada o fizesse prever – perguntar se podia vir também. E, do dia para a noite, comprou o bilhete de avião e andará no nosso autocarro a fotografar toda a digressão. Além de ser um dos melhores fotógrafos de música que conheço, é também um tipo fantástico e com uma grande sede de whisky. Respeito isso muito mais do que tantas outras coisas.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
11/12/2006