Foi em 2009 que ficamos seriamente a conhecer Zola Jesus. Mas Nika Roza Danilova já conhece Zola Jesus há muitos anos. Esteve sempre dentro dela, suspeitamos, mas com o excelente The Spoils deitou tudo cá para fora. E o que cá para fora saiu foram canções de tremenda beleza, resgatada pela extracção de matéria vinda dos locais mais escuros da vivência humana. Porque queremos conhecer mais e mais de Zola Jesus, convidamos Nika Roza Danilova a escolher as 10 canções que marcaram a sua vida neste preciso momento e o resultado é bem ilustrativo. Quem mergulhou já no mundo de Zola Jesus revê nestas escolhas uma profundidade estética ancorada na exploração discográfica pessoal de Nika Roza Danilova; quem nunca ousou conhecer o mundo desta norte-americana fica aqui com uma ideia muito justa daquilo que pode esperar antes de dar de caras com a grandiosidade de uma canção como “Clay Bodies”.
"Enchanté", Klaus Nomi: O Nomi foi definitivamente um daqueles artistas que apareceram do nada, contribuíram com algo tão fantástico e novo, mudaram o clima inteiro para a arte, e depois desapareceu sem que ninguém tivesse hipótese de saber o que os atingiu. Ele é um ícone, o Klaus Nomi é a minha Madonna... O seu talento e visão são até hoje inigualáveis.
"Burn My Eyes", Steven Grandell: Vai haver gente a tocar sintetizadores minimais para sempre, naquela mesma tradição fria e analogica como começou, mas quando eu ouvi a “Burn My Eyes” do Steven Grandell senti que ele tinha inventado tudo isto. Tem um ambiente tão pesado, esta canção leva-me a tantos locais emocionalmente e esteticamente.
"The Litanies of Satan/Wild Women With Steak Knives", Diamanda Galas: Meu deus, esta mulher é uma força. Isto é inacreditável. Quando ouço a Diamanda não consigo deixar de desligar todas as luzes e rolar num quarto escuro. É a única forma. E esta canção é como um êxodo de demónios internos. Estou tão agradecida pela Diamanda Galas existir e ter contribuído o que contribuiu para a sociedade porque agora o nosso mundo está para sempre mudado. Gosto também muito que ela tenha adaptado a poesia de Baudelaire para canções. É tão perfeito… é tão perfeito… fico doida quando ouço isso.
"Hail Aids", Brethren: Esta canção é bastante má. O contexto da canção e o statement da missão do artista é incrivelmente insular e intolerante. É difícil para muitas pessoas ultrapassarem isso quando ouvem Brethren. Mas as canções dele são tão apaixonadas, tão intensas, tão brutais e cruas, e sabes que aquilo que ele diz o faz com tanta convicção. É assustador mas ao mesmo é de certa forma fortalecedor que alguém possa fazer música como esta. É quase como um testamento à liberdade de expressão norte-americana. Eu não concordo com o contexto do seu projecto mas respeito que ele tenha a liberdade e a certeza para fazer isto. E esta canção é tão poderosa. É verdadeiramente tocante.
"Endstimmung", Sektion B: Tão poderoso. É industrial power-electronics mas bate-me da mesma maneira que me bate uma canção triste de amor. Faz-me sentir tão sozinha, mas também muito determinada. Ponho esta canção quando me sinto com vontade de apenas focar-me em sobreviver. É a minha canção de sobrevivência.
"Hounds of Love", Kate Bush: Sinceramente, poderia escolher qualquer canção no Hounds of Love... Eu revisito particularmente a canção que deu o nome ao disco por causa da sua qualidade minimalista mas ao mesmo tempo é tão cheia. A batida é pesada. Ela inspirou-me verdadeiramente a tentar criar canções grandes e bonitas; tal como esta.
"Destrozaron sus Ovarios", Esplendor Geometrico: A primeira vez que ouvi Esplendor Geometrico foi uma enorme revelação. É como quando tens um som na tua cabeça mas não o consegues encontrar fora de ti. Esplendor Geometrico foi como descobrir o som na minha cabeça que eu sempre quis ouvir.
"Town Hag", Sword Heaven: Isto é o mais metal que eu posso ser. É uma canção enorme, tão masculina, tão primitiva e bárbara. Quero que estes tipos toquem no meu casamento ou algo assim, preciso deles envolvidos na minha vida de qualquer forma. Não consigo fartar-me da violência dos Sword Heaven. Não podes ouvir passivamente a “Town Hag". Sempre que a ouço imagino-me a ser abanada e lançada por aí por um andróide do Conan o Bárbaro do tamanho do Godzilla. Esta vai ser a canção tema do apocalipse.
"Il Est Mort Le Soleil", Nicoletta: A Nicoletta tem uma voz enorme. Sobretudo numa altura em que o yé-yé era tão popular e todas as cantoras tinhas aquelas vozes pequenas que eram ofuscadas pela sua beleza “modelesca”. A Nicoletta era ao mesmo tempo talentosa e bonita. Sempre quis fazer uma versão desta canção mas a música é tão complicada que nunca consigo chegar a saber como!
"What Did You Do", Master/Slave Relationship: Sinto-me sempre atraída por mulheres fortes, do tipo daquelas que conseguem jogar com os rapazes. A Deb Jaffe (Master/Slave Relationship) é um terror mas ao mesmo tempo muito aberta sexualmente e feminina. É verdadeiramente fenomenal. O seu conceito de textura sonora é fantástico, especialmente nesta canção. E aquele gancho é tão intenso!