Listas dos melhores 2008
· 09 Dez 2008 · 01:34 ·

Top 2008 · Top Portugueses 2008 · Momentos 2008 · Tops Ilustres

©Teresa Ribeiro

O que é um disco, um álbum? É um CD? Uma pasta de mp3? Uma rodela de vinil de doze polegadas? Uma cassete? Uma colecção de canções que uma pessoa ouve enquanto faz amor? Enquanto está triste por não fazer amor? Por se lembrar de quando fez amor? Porque nunca fez amor? É o produto de demasiado dinheiro gasto num estúdio por um génio louco sob o efeito de estupefacientes e ilegais e talvez armas (sim, Sly Stone, estamos a falar de ti)? É o produto de gravações feitas por um microfone ligado a um gravador de quatro pistas estrategicamente colocado por baixo do lavatório de um T0 num bairro pobre da cidade porque assim é mais verdadeiro e sincero? Não é nada disso. É tudo isso e muito, muito mais. Uma sequência de canções, talvez alterada por imposições da editora discográfica, talvez pensada de raiz pelos músicos, pelo produtor, pela miúda que alguém queria engatar, pelo homem do lixo, etc. E não só de canções, às vezes pode ser só de barulhos. Pode ser tudo, não se sabe ao certo. Só se sabe que, qualquer que seja o formato, qualquer que seja o sítio, a década, o ano, o mês, o dia, a hora, o minuto, haverá sempre alguém que quer ouvir aquelas faixas naquela ordem. Isso nunca mudará. E nunca, por muito que se diga que isso está para acontecer, deixará de haver quem tenha essa vontade. Como acontece todos os anos, apresentamos a lista das colecções que mais sentido fizeram para nós este ano. E, como sempre, é algo subjectivo, sem qualquer pretensão. Porque há aqueles que ouvem discos para fazer amor e aqueles que ouvem discos porque não fazem amor. Há sempre visões diferentes de tudo.
Rodrigo Nogueira

30.
Lambchop
OH (ohio)
City Slang / Nuevos Medios
  Depois da semi-desilusão que foi o duplo C’mon e do mediano concerto na Aula Magna em 2004, pairava a ideia que os Lambchop tinham perdido a graça inicial, que a fasquia tinha baixado consideravelmente e que não iriam voltar aos padrões de qualidade a que nos tinham habituado. Este novo OH (ohio) veio desmentir essa ideia, com um magnífico conjunto de canções da melhor colheita lambchopiana. E mais uma vez fica provado que Kurt Wagner é um grande escritor de canções, despidas de ornamento mas capazes de transmitir uma infinita sensibilidade. Provavelmente este novo álbum não está ao nível do etéreo “Is a Woman”, mas consegue aproxima-se do patamar dos clássicos “How I Quit Smoking” ou “What Another Man Spills”. E tem dos melhores títulos do ano: “I'm Thinking of a Number”, “National Talk Like a Pirate Day" ou “Sharing a Gibson with Martin Luther King Jr”. A falange choninhas do corpo redactorial do Bodyspace saúda efusivamente este regresso da banda de Nashville, Tennessee à boa forma. Nuno Catarino

29.
Cut Copy
In Ghost Colours
Modular Interscope
  A escolha do nome Cut Copy para um projecto afecto à electropop ilustra bem o facto de, nos dias de hoje, o género pouco dever à originalidade. Ao invés, alimenta-se de um melhor ou pior trabalho de corte e costura a partir de matéria-prima fabricada há muitos anos. A banda australiana integra o lote de músicos que prestigiam a arte do monge copista e conferem à receita-mãe ingredientes apetitosos. In Ghost Colours é o segundo registo de uma caldeirada feita de new-wave, dancemusic, punk e rock alternativo. Tantos estilos misturados redundaram numa mescla um tanto ou quanto intemporal que os poderá demarcar de outros projectos válidos (Ladytron ou Hot Chip são alguns de muitos) mais sujeiros à arbitrariedade das tendências. Susceptível de alienar muito mais ouvidos do que o álbum de estreia Bright Like Neon Love, por força da sua vertente pop, não corre, contudo, o risco de se tornar uma criação banal. Para atestá-lo, é favor ouvir “So Haunted”, surpreender-se com “Lights & Music” e convencer-se com “Strangers in The Wind”. Partir para a descoberta do resto será desejo automático. Eugénia Azevedo

28.
Deerhoof
Offend Maggie
Kill Rock Stars / Sabotage
 

Quase todos os anos é ano de discos de Deerhoof. E se isso pode funcionar mal – e muito mal – com alguns, com estes norte-americanos/extraterrestres é uma dádiva. Apesar de todas as contrariedades e mais algumas, os Deerhoof conseguem com Offend Maggie um conjunto de canções com alta média (e mediana) de esquizofrenia e estranheza – as doses do costume, portanto. Eles conseguem mais uma vez ser coerentes na diversidade, concisos na explosão de ideias, desmiolados nas explorações, demoníacos nas intenções. Cada canção é uma aventura, uma viagem com bilhete só de ida aos confins da mente humana, uma manifestação daquilo que não é controlável pelo Homem. Satomi Matsuzaki continua firma na liderança de um colectivo que faz tão bem ao rock como a Nívea faz bem à pele. E já que falamos nisso, há aqui uma série de exteriorizações que são de levantar os pêlos dos braços. André Gomes


27.
Vetiver
Thing of the Past
Gnomonsong
  Thing Of The Past é um álbum de covers de músicos que Andy Cabic considera seminais, como Loudon Wainwright III, Michael Hurley e Townes Van Zandt, mas isso não faz deste disco uma obra menor. Cabic considera que este é o seu melhor trabalho, porque se pôde concentrar em “trazer ao de cima” o melhor de si e dos seus comparsas. Como seria de esperar, os Vetiver não inventam muito, mas conseguem uma depuração formal que torna este conjunto de canções, no seu todo, em algo de muito especial. Há temas orelhudos como “Roll On, Babe” e “Hook & Ladder”, mas o bom gosto das escolhas é irrepreensível. No fundo, Thing Of The Past funciona como uma espécie de manual de iniciação a quem quiser conhecer o grande folk e country norte-americano dos anos 1960-70. João Pedro Barros

26.
Beck
Modern Guilt
XL / Popstock
  O mundo particularmente atento a Beck estremece a cada nova evidência que indique um afastamento irreversível em relação à era da “farra e braguilha aberta” que conheceu o seu zénite em Midnite Vultures. Quando os Dust Brothers actualizaram o colorido-Odelay para pintar um Guero ligeiramente previsível, alguns terão respirado de alívio convencidos de que não era definitiva a viragem melancólica de Sea Change, mesmo que esse documento de desgosto amoroso represente ainda hoje o mais intocável dos discos de Beck. Pode-se apenas supor que Beck tenha aproveitado a aclamação de Sea Change como incentivo para arriscar a tristeza como tonalidade de discos futuros. A teoria ganhou terreno: mesmo batalhando a frustração com alguns momentos risonhos (“Gamma Ray” é o tema de surf-rock que faltou a Dick Dale), Modern Guilt faz-se de pop desencantada essencialmente assente no cinzento das reticências e questões insolúveis. É o disco de encruzilhada que obriga Beck a decidir-se entre o papel de entertainer e o de crooner. Enquanto o dilema não deixa de o ser, ergue-se o mais precioso disco de Beck desde Sea Change. Miguel Arsénio

25.
Excepter
Debt Dept.
Paw-Tracks / Flur
  Na corrida (não pronunciada) que levou a prata de Brooklyn - Black Dice, Animal Collective, Gang Gang Dance - a assimilar e adaptar traços de pura electrónica europeia (do house ao tecno), os Excepter, além de pioneiros nessa rota, terão sido os mais ambiciosos e provavelmente os menos reconhecidos por isso. Entende-se que esteja mais sujeito à paródia um colectivo infame pelos seus sets ruminantes e submarinos que excedem as seis horas. Condenados a serem observados como excêntricos entregues ao seu umbiguismo, o valor dos Excepter transcende em muito o mito associado: Debt Dept. torna quase palpável uma dimensão surreal dominada por club music em decomposição e rave apocalíptica. Não é todos os dias que surge uma banda-sonora tão apropriada ao fim dos dias. É um disco preparado para as massas, mas intrinsecamente afunilado pela subversão do guru John Fell Ryan, que, em vez de convidar à amizade (como acontece noutra missa francesa), incita à carnificina em “Kill People” (tema medalhado no pódio reservado às mamadices deste ano). Miguel Arsénio

24.
James Blackshaw
Litany of echoes
Tompkins Square
 

Sempre se notou em James Blackshaw uma necessidade de sair da rotina imposta pela guitarra de 12 cordas introduzindo outros instrumentos nas belíssimas composições que vai editando com regularidade. Mas desta vez a empreitada é maior, mais complexa. Litany of Echoes é belo do inicio ao fim e muito por culpa da introdução de piano e cordas; ousa assemelhar-se inclusive a uma obra da música dita clássica (ou erudita) pela sua complexidade. Como se se tratasse de um Concerto para Piano e Guitarra de 12 Cordas. A beleza de uma canção como “Past Has Not Passed”, nos seus rodopios e reviravoltas, na sua fragilidade e melancolia, não devia passar despercebido a ninguém num mundo que se diga justo. No todo, são seis peças de uma formosura rara, um enorme passo em frente para o britânico James Blackshaw. André Gomes

23.
Sonic youth
Andre Sider Af Sonic Youth
SYR
  Bastaria o facto de ser a melhor banda do Mundo para reconhecer Andre Sider Af Sonic Youth como um dos melhores álbuns deste ano, mas para um projecto com um fundo de catálogo tão imponente o risco deste passar despercebido é também uma triste realidade. Oitavo capítulo das mui recomendáveis aventuras na sua Sonic Youth Records, atira o rock ao free jazz em combustão noise, na companhia do brilhante saxofonista Mats Gustaffson e do incontestável rei do barulho Masami Akita (Merzbow). Em mais uma demonstração de que quase tudo o que rock fez de bom nos últimos vinte cinco anos se lhes deve. Mesmo. Bruno Silva

22.
Erykah Badu
New Amerykah, Pt. 1: 4th World War
Motown / Universal
  Erykah Badu é muito provavelmente a mais interessante herdeira de vozes como Billie Holiday e Nina Simone. E nesta primeira parte da sua New Amerykah, Badu passeia o perfume soul dessa tradição e absorve o hip-hop das ruas de Brooklyn, onde tem um apartamento que, no início do ano, abriu ao jornal New York Times. Este disco é tão bom que a ideia de ver Erykah Badu arrumar as botas para a música, como se chegou a temer, arrepia. A sua Quarta Guerra Mundial é um ensaio cheio de estilo, com oradores como Madlib em “The Healer” (uma ensombrada fábula que mete curandeiros), Shafiq Husayn e Om’Mas Keith, ambos do trio Sa-Ra, em grande parte do disco e outros suspeitos do costume. Badu apura o seu pensamento social em “Soldier”, onde fala do Islão e do crime racial, e em “Twinkle”, um tratado sobre os buracos nos vários sistemas norte-americanos. E há ainda “Telephone”, uma bonita homenagem a J Dilla, escrita um dia depois da despedida ao malogrado produtor. É disco para ouvir até riscar. Helder Gomes

21.
Nick Cave & The Bad Seeds
Dig, Lazarus, Dig!!!
Mute
  Sem nunca fazer um álbum mau, Nick Cave andou mais ou menos perdido com coros gospel e composições aveludadas em Nocturama e Abattoir Blues/The Lyre of Orpheus. Em Dig, Lazarus, Dig!!! passou-se algo mais importante do que um mero regresso a um som mais cru, influenciado pelo projecto paralelo Grinderman: há outra vez canções irrepreensíveis, concisas, verdadeiras pérolas. Falamos, por exemplo, de “Midnight Man” ou dos belíssimos versos de “Jesus of the Moon” (não há mais ninguém a escrever assim no universo pop/rock). O australiano e os seus Bad Seeds assinam o melhor álbum desde No More Shall We Part e mostram estar finalmente refeitos da saída de Blixa Bargeld. João Pedro Barros


30-21 | 20-11 | 10-1


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