Bonga / B Fachada
Galeria Zé dos Bois, Lisboa
27- Jan 2017
Os últimos anos têm sido bons para Bonga. Depois de ter sido votado a algum esquecimento (ou menosprezo, ou até mesmo racismo), o homem responsável por Angola 72 e pela disseminação do semba pelo mundo voltou a estar nas bocas dos melómanos. Para isso contribuiu o respeito de toda uma nova geração, representada, esta noite, por B Fachada. E também - não será tolo dizê-lo - o novo interesse pela música da Mãe África, potenciado por blogues como o Awesome Tapes From Africa e pela arqueologia que a Internet proporciona.

Mas aqueles que acudiram ao apelo da Zé dos Bois não eram apenas os jovens; também havia fãs de longa data, os que ainda apanharam os tempos da Guerra Colonial e do 25 de Abril. E havia o meio-termo, os que cresceram a ouvir as suas canções enquanto crianças, especialmente a "Mariquinha" que alguns pais cantavam para adormecer. A sala lisboeta encheu para aquele que foi um concerto especial, íntimo, fervendo de ritmo e de dança - poucas vezes foram aquelas em que foi possível permanecer quieto e sossegado.

Quase com 75 anos, Bonga continua a dar um espectáculo irrepreensível, focado não (só) em Recados De Fora, o seu último álbum, mas também naquilo que é o seu antigamente. "Mariquinha", claro, passou por ali e levou-nos para Angola. Êxitos como "Olhos Molhados" também ecoaram pela sala. E ainda "Homem Do Saco" ou "Ngana Ngonga", acompanhadas com mestria pela sua banda. Entre as músicas, o humor de um homem que sente já não ter nada a provar, seja sobre política ou sobre mulheres (estas últimas, notava-se, iam provocando algum desconforto entre os mais feministas...). Faltou "Kapiango", insistentemente pedida por um dos presentes, mais velho, mas sem sucesso.

Antes disso, foi a vez de B Fachada fazer a transição entre o passado e o presente, num concerto infelizmente marcado por vários problemas de ordem técnica mas onde não faltaram futuros clássicos como "Afro-Xula" (seria indispensável, numa noite assim), "Quem Quer Fumar Com O B Fachada", "Crus" ou "Joana Transmontana", esta última cantada à viola, bem perto de um público que entoou a plenos pulmões todos os versos daquele que querem ver um dia como o novo Dylan. Agora só falta que escute os lamentos e prepare, asap, um disco novo.
· 31 Jan 2017 · 23:56 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

Parceiros