Psychic TV / Les Baton Rouge
Centro Cultural do Cartaxo
24- Abr 2013
É impossível não fixar o olhar: Genesis P-Orridge, loiro falso, tranças, rosto pintado, uns imensos quilogramas a mais que de certa forma escondem as alterações plásticas efectuadas aos peitos e a já conhecida indefinição sexual, misturada com projecto artístico e com a ideia de liberdade absoluta (somos livres deixando de ser nós próprios): chamam-lhe pandroginia, haverá quem pense mais num freak show, e outros gabar-lhe-ão a coragem, tendo visto The Ballad Of Genesis And Lady Jaye e chorado pela sua viuvez. Que não restem dúvidas de que Genesis, ex-mentor dos Throbbing Gristle e desde há muito para cá o cabecilha dos Psychic TV, agora PTV3, foi o foco principal dos que entraram no auditório do Centro Cultural do Cartaxo para mais uma Session alimentada a rock psicadélico e a vinho abafado. Esteve ali, de pé, para nós voltado, erguendo os braços, recitando poemas e cantando Funkadelic, Hawkwind e Can; esteve ali, e no final de "Maggot Brain" - com a qual a banda abriu o concerto - há alguém na audiência, uma voz feminina (sem que se possa confirmar se era realmente feminina - desconfiem de tudo, desconfiem de tudo) que grita I LOVE YOU, de imediato sorriso nos lábios dest@ que nasceu em Inglaterra e que terá pensado, do alto da sua posição enquanto figura de culto, do what thou wilt shall be the whole of the law, sem que tenhamos tempo de, ironicamente, comparar isto com o facto de que antes Genesis cantava sobre a disciplina.

© Francisco Sapinho

Estas cem pessoas, não mais, este temple of psychedelic youth, estes muitos góticos, punks, velhas guardas, e miúdos que, claro, tomam de assalto a frente do palco, todos eles daqui saíram amando-@ mais, amando-se mais, amando sobretudo a tinnitus e as dores musculares, porque "Silver Machine" tinha de ser ouvida no meio de uma tentativa de mosh, e a bateria tinha de acabar parcialmente destruída, ou não seria rock. Seguem-se "Alien Sky" e "White Nights" (this song is 21 years-old, like me), alongadas até onde se pôde, metal e ácido pingando da guitarra, groove e ritmos kraut, terminando-se com uma versão fantástica de "Mother Sky" e de "Hurry On Sundown", até as luzes se apagarem e ficar apenas no ar uma voz carcomida, em loop, a indicar-nos que os PTV3 não voltariam mais ao palco naquela noite; mas têm, urgentemente, de voltar noutra noite, quanto mais cedo melhor. O Cartaxo continua a não nos desiludir - pelo contrário, só nos tem fascinado em crescendo.

© Francisco Sapinho

Antes dos PTV3, os lisboetas Les Baton Rouge aqueceram o palco - e os seus próprios dedos, que há EP novo prontinho a sair - com o rock de riff cru e perigoso, rock de banda-sonora de um qualquer heroinómano que sente o pulsar do ruído ao mesmo tempo que espeta a agulha - o Trainspotting enquanto género musical e não livro/filme de culto -, pós-punk moderno que cumpriu e bem a sua função: estrear o palco e estrear os ouvidos dos presentes. Tivessem estes últimos tido um pouco mais de coragem, e também teriam assistido ao trio de pé, já que estes bem que mereciam um pouco mais de carinho. Além disso, o rock não é para se ver sentado. Tessalonicenses, 5:3.
· 27 Abr 2013 · 11:04 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

Parceiros