Wooden Wand / Filipe Felizardo
Kolovrat 79, Lisboa
12 Fev 2011
Espaço lindo situado ali para os lados do Príncipe Real, a galeria Kolovrat 79 é mais uma das descobertas da Filho Único para as suas, cada vez mais mais (e merecidamente) concorridas noites de concertos. Sótão amplo com ares de loft sem tiques aburguesados, viu-se composto por uma plateia bem simpática numa noite onde Cormac McCarthy esteve omnipresente em ambas as actuações.

Em “festa de lançamento” de lII = 207.8°, bII = ?56.3°, Filipe Felizardo recomeça novo ciclo depois de apresentar “Conjectures & Refutations” pela última vez no Festival Rescaldo. Daquilo que se viu nesta noite, o gajo não estava a mentir quando falou de “um fascínio por coisas pomposas, extáticas” em entrevista recente ao Bodyspace. Contrapondo à dimensão ligeiramente mais fragmentada dessas últimas actuações, esta estreia no Kolovrat 79 atirou-se a uma monumentalidade, até agora, sentida apenas a espaços. Épica, sem incorrer em excessos barrocos, a peça apresentada fez do riff (presença tutelar, entre a noção de espaço de Dead Man do Neil Young e a parcimónia de Dylan Carson) um drone poluído por constantes intervenções de guitarra, ora dedilhada em tonalidades folky, ora filtrada pela estaticidade do e-bow, adensando a gestalt em constante mutação. Sempre em cima, apenas se perdeu durante uns cinco minutinhos, numa hesitante exploração dos seus recursos, quando cavalgar a tempestade de areia seria já uma tarefa hercúlea. Saiu em distorção. Saiu muito bem. Já é hábito.

Se o concerto de Filipe Felizardo já sugestionava o fantasma do autor de Blood Meridian em referências mais ou menos subliminares, estas foram assumidas quando James Toth (Wooden Wand) referiu as paisagens do Tenessee antes dessa homenagem sentida a um shithole que é “Shaving Cold”. É sobre estas temáticas, mais ou menos mundanas, permeadas por um sentimento de ausência que os temas de Wooden Wand versam sem acessos de auto-comiseração. Na tradição de cantores on the road como Waylon Jennings ou Kris Kristofferson. Com essa faceta de storytelling a resvalar para fora de canções como “Rolling One Sun Blues” ou “The Ark” e assumirem um peso preponderante entre estas. Antes desta última (sobre um amigo chato), Toth teve todo o à vontade para contar uma anedota. Sem acessos de entertainer, mas de uma humildade desarmante. Reflexo da música de Wooden Wand, que numa cadência derivada da folk, dos blues e da country, se faz de torch songs simples onde as palavras interessam. Com um som discernível e cristalino como se exigia (as bizarrias ficam para as colaborações com Vanishing Voice), eventualmente se instalou um certo torpor (habitual nestas coisas do “homem e uma guitarra”) derivado das estruturas repetitivas que se iam encandeando mais para o final, quando a atenção para as palavras se dispersava. No final, regresso ao belo James & the Quiet quando o espírito já estava devidamente preenchido.
· 17 Fev 2011 · 20:29 ·
Bruno Silva
celasdeathsquad@gmail.com

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