High Places / One Might Add
Galeria Zé dos Bois, Lisboa
11 Dez 2008
A Zé dos Bois acordou tarde. Já passava bem das 23 horas anunciadas quando os portugueses One Might Add aterraram a bordo da nave Kluster (sim ainda com k) de Zwei Osterei e afins. Ruído vs. melodia que não casava bem com a maior parte dos ouvidos ali presentes, ávidos de melodias felizes e não de desesperos industriais. Contudo, fora um ou outro desafino, próprio de um lugar que nunca tem as melhores condições (mas sempre com as melhores intenções), quem fez algum esforço para ouvir os One Might Add, sentiu-se recompensado certamente. Como o nome indica, eles acrescentaram algo, distraindo por momentos uma ansiedade crescente à volta do duo acabado de chegar do Porto vindos de Nova-Iorque num viagem desde Tóquio. Jet lag de tournée mundial merecida que os partilhará com a Europa inteira, com a Austrália pelo meio.

E à meia-noite e meia, eis os viajantes que fazem música que faz viajar. Para descrever o que seguiu nada melhor do que potássio, vitamina C, B1, B6, B12, fibra, ferro, cálcio. Influências que os High Places declaram no seu myspace. Ingredientes essenciais ao crescimento saudável de qualquer criança que podem muito bem ser as suas músicas, curtas como a vida de um rebento. Na forma abrupta em que acabavam cada música perante uma Zé dos Bois sorridente como um coro de pais numa maternidade, a verdade é que ficou sempre no ar uma noção de que as músicas estão em crescimento. Embriões, bebés, crianças que se tornarão adultas a caminho de High Places. Porque assim o nome indica e assim parece. Este duo adoptado pela seminal Brooklyn nova-iorquina tem tudo para ir longe. Um futuro risonho para eles e para o bebé Berkeley. “É a minha sobrinha” dizia Mary Pearson à audiência enquanto a imagem do bebé se projectava gigante nas suas costas. “Ele é mesmo assim gigante” acrescentava o suado-tímido-que-mesmo-assim-fala-bastante Robert Barber. Atrás deles, o infante gatinhante aparecia e desaparecia por entre imagens de frutas, legumes, céus, mares. Ao mesmo tempo as vitaminas e os sais minerais nutriam-nos o corpo à medida que as canções giravam, num caleidoscópio de temas sobretudo do seu álbum homónimo de estreia. Nursery rhymes que embalavam sonhos tropicais iniciados logo com “A Field Guide” e o seu distintivo loop à la Spacetime Continuum lá para o meio (um dos nomes míticos da legendária editora de electrónica Rephlex Records). Electrónica IDM que eles repescam e absorvem com uma esponja de samples e loops de tudo e mais alguma coisa tropicaliente. E daí resultam coisas lindas como “Namer”, “Golden”, “Vision’s the first”, “Gold Coin” que foram tocando para a plateia a espaços dançante.

High Places © Vera Marmelo

Nisto, a voz de Mary realmente lá insinuava uns longínquos Young Marble Giants mas as bugigangarias melódicas de Robert anunciam cada vez mais paraísos fiscais bem longe do País de Gales dos YMG, psico-caraíbas na onda de Panda Bear e El Guincho. Batucadas com pedragulhos, madeiras e calypsos em divertida caldeirada celestial a bordo da voz de princesinha da realmente princesinha Mary. Sempre linda, sempre risonha, sempre dançante, sempre “Obrigadah” no fim.

High Places © Vera Marmelo

O auge surgiu com “From Stardust to Sentience” e depois “Head Spins”, o melhor single disponível na colectânea 3/07 – 09/07 que os lançou. Houve encore, com uma revelação pelo meio – o microfone de Robert não estava com grande som e só nestes minutos finais se ouviram em condições os seus suspiros e murmúrios psicadélicos que teimavam em não acompanhar Mary. E novamente num auge de repente acabou, porque tudo o que é bom acaba depressa, como dizia alguém. “Voltem depressa” provavelmente diziam todos.
· 12 Dez 2008 · 15:31 ·
Nuno Leal
nunleal@gmail.com
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