Bang on a Can
Casa da Música, Porto
10 Fev 2007
Quando em 1978 publicou Ambient 1 – Music for Airports, Brian Eno afirmou no booklet do disco que a música ambiental deveria ser capaz de acomodar muitos níveis de atenção auditiva sem forçar nenhum em particular. Disse também que a música ambiental deve ser tão ignorável quanto interessante. De facto, Ambient 1 – Music for Airports, que chegou a ser apresentado como instalação no Marine Air Terminal do aeroporto de LaGuardia, em Nova Iorque, cumpre todos esses requisitos; é cativante mas não aprisiona; é ao mesmo tempo um disco desafiante e de fácil e rápida fruição; belo e inserido numa realidade concreta, num ambiente especifico.

Bang on a Can © Joana Pinho

Movido pela admiração ao trabalho de Brian Eno, há alguns anos atrás, o colectivo nova-iorquino, Bang on a Can, criado em 1987 pelos compositores Michael Gordon, David Lang e Julia Wolfe e ligado por cordão umbilical ao festival com o mesmo nome, tratou de transpor Ambient 1 – Music for Airports para ser tocado ao vivo por uma orquestra; compôs arranjos para que isso fosse possível. O resultado foi uma digressão e um disco lançado em 1997 pela Point Music. O trabalho dos nova-iorquinos levou a que o próprio Brian Eno afirmasse que Ambient 1 – Music for Airports tinha crescido e se tinha tornado num ser completo – apesar das vozes que acham que a intervenção dos Bang on a Can vai contra a própria ideia da música ambiental.

A apresentação de Ambient 1 – Music for Airports era provavelmente o principal motivo da vinda dos Bang on a Can ao Porto, mas não o único. A presença dos Bang on a Can na Casa da Música aconteceu dividida em duas actuações. Uma primeira às 18:00 e outra às 23:00. Ao mesmo tempo os Bang on a Can lançavam um sorteio de uma viagem e estadia para 2 pessoas em Nova Iorque para assistirem ao Festival Bang on a Can em Junho de 2007. Mas foi então por volta das 23:00 que se começou a escutar “1/1”, tema composto por Brian Eno, por Robert Wyatt e Rhett Davies. Na peça dominam os sons do piano (que se repetem) e toda uma ambiência que é criada respeitando sempre o silêncio e as pausas. A interpretação dos Bang on a Can mostrou-se desde logo respeitosa e sublime. Os seis músicos em palco tinham a matéria bem estudada – não é à toa que o San Francisco Chronicle lhes chamou “o veículo de música contemporânea mais importante do país”.

Bang on a Can © Joana Pinho

Se na segunda faixa de Ambient 1 – Music for Airports, “2/1”, as vozes femininas dominam por completo, nas mãos dos Bang on a Can essas mesmas vozes (pré-gravadas) são quase um apêndice numa teia instrumental reduzida ao essencial. As vozes continuaram em “1/2” e dividiram protagonismo com o piano e com a guitarra, num dos momentos mais intensos do concerto. O diálogo entre o piano e a guitarra ficaram gravados na memória da actuação. A fechar, “2/2” mostrou-se mais cheio do que nunca, com a guitarra a fazer uso de um e-bow para se agigantar e com instrumentos de sopro a ganharem protagonismo (as cordas e o metalofone - mais as primeiras que o último - também o haviam feito noutras alturas).

A representação dos Bang on a Can da obra fundamental de Brian Eno nunca se limitou a imitações; antes, partiu dela para, como disse e reconheceu Brian Eno, lhe dar uma outra vida, uma outra dimensão, distinta mas não necessariamente contraditória. Mais do que no encore (que não impressionou especialmente), a primeira parte de interpretação de Ambient 1 – Music for Airports teve momentos verdadeiramente sublimes.
· 10 Fev 2007 · 08:00 ·
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
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