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Exploding Star Orchestra We Are All from Somewhere Else

2007
Thrill Jockey


De Rob Mazurek, o mentor de grupos fundamentais que marcaram a história do jazz e do rock alternativos dos últimos quinze/vinte anos, podemos sempre esperar a novidade. Desde os Isotope 217 ou Chicago Underground até aos mais recentes São Paulo Underground ou Mandarin Movie, a criatividade percorre sempre caminhos próprios, particulares, originais. Utilizando fórmulas diversas, por vezes mais puras, outras vezes miscigenadas, a música de Mazurek parte da tradição do jazz - ele era inicialmente um seguidor do hardbop, acusando inspiração de Lee Morgan ou Freddie Hubbard - mas aventura-se sempre mais além. Seja pela introdução de elementos electrónicos (São Paulo Underground), pela aproximação rock/noise (Mandarin Movie) ou pelas diversas parcerias onde colabora (Tortoise, Gastr Del Sol, Stereolab), a música em Mazurek nunca é previsível.

Exploding Star Orchestra é o mais recente e ambicioso projecto do trompetista. Ensemble de catorze elementos, esta trupe engloba alguns dos melhores músicos de Chicago. A lista de membros deste grupo é impressionante - só para mencionar alguns: Jeb Bishop (Vandermark 5), Jeff Parker, John McEntire (Tortoise), Corey Wilkes (colaborador do Art Ensemble of Chicago), Jason Lux, Matthew Ajemian (Mandarin Movie), Nicole Mitchell (que Anthony Braxton referiu numa recente entrevista à revista Jazz.pt como um dos maiores talentos a emergir em Chicago). Poderia dar-se o caso de tanto talento reunido ser desperdiçado, mas Mazurek enquanto líder /orquestrador/compositor/arranjador trata de aproveitar os talentos individuais e encaminhá-los para o melhor resultado comum.

Apesar da extensão da lista de colaboradores, este é um projecto muito pessoal de Mazurek. Fica uma breve explicação, nas palavras do próprio: “We Are All from Somewhere Else corresponds to a story involving an exploding star, cosmic transformation, a sting ray, the travels of the sting ray, intelligent conversations with electric eels, the destructive power of humans, the death and ascension of sting ray, the transformation of sting ray ghost to flying bird, and the transformation of bird to phoenix to rocket to flying burning matter to a new-born star.†Esta história está contada num poema que vem nas liner notes e que lido de trás para a frente mantém o sentido.

Conceptualizações aparte, a música vale por si só. Dividido em três peças, este álbum é a materialização da música escrita por Mazurek com alguns curtos espaços para intervenções individuais. Na melhor linhagem da escrita jazz para big-bang, Mazurek trabalha numa direcção contemporânea (George Lewis será referência importante) e pela inclusão de elementos externos percebe-se que a inspiração inscrita no booklet (Luc Ferrari, Gyorgy Ligeti, Satie) não é à toa. As duas grandes peças principais, “Sting Ray and the Beginning of Time†e “Cosmic Tomes for Sleep Walking Loversâ€, divididas pelo pequeno interlúdio ao piano “Black Sunâ€, são subdividas em várias secções que acrescentam densidade à concretização de cada peça.

Quer seja pela força das peças compostas por Mazurek ou pelas interpretações e intervenções individuais (o próprio Mazurek, a flauta de Nicole Mitchell, a guitarra de Jeff Parker), este disco revela-se uma das mais elaborados obras dos últimos tempos a explorar em profundidade as possibilidades do jazz e as relações entre a composição e a improvisação. Com todos os elementos cuidadosamente trabalhados, este We Are All from Somewhere Else traduz-se num importante documento de jazz contemporâneo, sem preconceitos, disciplinado e aberto. Chicago está de volta e em força. Em cada nova audição fica a impressão que o ano de 2007 passa forçosamente por aqui.


Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
23/04/2007