Não será um novato na matéria, nem será um completo desconhecido. Envolvido no desenvolvimento estético de um suposto french-touch e tendo produzido ou remisturado alguns nomes durante o perÃodo mais estimulante do mais interessante fenómeno musical francês dos últimos anos, Dj Mehdi revela-se agora um artista criativamente maduro e certo do seu papel na cena musical francesa e mundial. Não lhe será alheio a paixão pela velha escola hip-hop e a forma como ela se reflecte na sua arte de produzir beats.
O tÃtulo começa por frisar a sorte de um rapaz que desde cedo começou por fazer o que a alma lhe ditou. E nada como deixarmo-nos envolver no gosto que Mehdi encontrou para se expressar. O electro-funk mecanizado ao gosto dos b-boys de 84 assalta-nos a memória e obriga-nos a rever o virtuosismo natal de uma cultura que nasceu nas ruas de Nova Iorque. Presentemente, Harry Belafonte talvez não tivesse grandes dúvidas em escolher a "banda sonora" Lucky Boy para um eventual Beat Street contemporâneo.
Não faltarão motivos de interesse electro-funk robusto numa conjectura que neste momento talvez favoreça muito mais os companheiros de editora como Justice ou Sebastian que, pegando no espÃrito libertino dos Daft Punk de Homework, conseguem fazer implodir um som sujo de consciência rock numa matriz house. Ao seu ritmo, Lucky Boy entretém como poucos mas essencialmente recorda-nos texturas rÃtmicas que julgávamos perdidas na memória colectiva. Ou seja, é funcional nas recordações que suscita e menos interessante na novidade que governa.
Lucky Boy não é nem será o momento chave na revitalização do fenómeno french-touch, pelo menos como o conhecemos de momento. Não que não o pretenda ser, como assim se expressa, mas simplesmente o que hoje em dia se entende por french-touch é radicalmente diferente das premissas instituÃdas em finais de 90 por uns Daft Punk, Cassius ou Alex Gopher. Por isso mesmo, e o disco soando em loops samplados como os melhores de há 10 anos atrás – que por sua vez já recriavam à luz da tecnologia digital a agilidade técnica manual de há 30 anos –, perde um pouco pela falta de oportunidade que o inÃcio desta década lhe poderia ter dado. Com isto não se pretende afirmar que esteja deslocado no tempo, apenas que o sentimento genuÃno do french-touch que carrega talvez fosse acolhido com outros olhos quando o mundo para aà estava voltado.