"I do like sad songs," Beth says in their defence. "I find it really hard to write a happy song without it sounding somehow melancholic".
Finalmente. Mais do que o álbum a solo da vocalista dos Portishead, “Out Of Season” é o álbum da herdeira, em todos os sentidos, de Nick Drake (a quem é feita a devida homenagem, através do tema “Drake”) e de todos os músicos de quarto que gastam horas a sós com uma guitarra. Com a diferença de que a voz de Beth é mais do que sublime. É quase perfeita. Arrepia e transforma tudo à sua volta, principalmente agora que a ouvimos tão despida, tão cru e exposta.
Ao lado de Paul Webb dos Talk Talk (agora conhecido por Rustin’ Man, nome tirado de uma música de Out Of Season), as criações bethianas são, antes de mais, e de forma conceptual, “beatless”, ou seja, desprovidas de ritmos dominantes (embora as vassouras marquem presença de forma subtil), deixando que as melodias vocais, acompanhadas quase sempre pelo contrabaixo e pelos coros dreamy, nos esculpem a percepção e nos façam, de forma definitiva, adormecer.
São poucos ou quase nenhuns os paralelismos entre “Dummy” ou “Portishead” e este “Out of Season” (com a excepção, talvez, de “Funny Time Of Year”). Onde antes haveria tensão, paranóia, negritude, há agora conformismo e intimidade; é, de certa forma, o percurso lógico de quem começou a cantar em bares de má-fama, conseguiu um lugar numa das bandas mais interessantes dos anos 90, e que agora se liberta de todas as pressões. É um retorno ao útero, ao começo, à atmosfera telúrica que marcou os primeiros anos de existência de Beth Gibbons,e, simultaneamente, a afirmação da sua maturidade. O próprio nome do álbum foi escolhido porque, segundo ela, “Eu e o Paul Webb já não somos propriamente novos”. Esta temática da idade continua com Beth referindo o inevitável crescimento com a idade: "There's stuff there about getting older. I've only just realised my mortality. When you're younger, inevitably you don't see it as a reality, but it seems to be looming, and that's quite frightening - you realise how much you're going to miss people.”
Este álbum contĂ©m as idiossincrasias e as introspecções que nunca seriam possĂveis com os Portishead, porque estes sĂŁo inevitavelmente mais densos, consequĂŞncia de serem o conjunto de trĂŞs mentes brilhantes (para alĂ©m de Beth, constituĂdos por Adrian Utley e Geoff Barrow).
Notam-se, por outro lado, as raĂzes sonoras tĂŁo diferentes das destes – Utley com o jazz e Barrow com o hip hop e as bandas sonoras – assentes principalmente no carisma da voz de Billie Holiday, Nina Simone ou do já referido Nick Drake. “There's not only emotion in the way you sing but also in what you sing”, como ela prĂłpria refere, sendo esse o aspecto em que difere Beth Gibbons da maioria das torch singers: a profundidade da mensagem. “Out Of Season” Ă© extremamente autĂŞntico, na medida em que se transmite, de forma preciosa, o que se sente, nĂŁo o que outros sentem por nĂłs.
É tambĂ©m enormemente especial, raro, delicado, e, nĂŁo de forma paradoxal, um álbum difĂcil. DifĂcil por ser de Outono (e ao mesmo tempo “Out of Season”, intemporal), mas tambĂ©m porque faltam as sonoridades multi-layer dos Portishead , compensadas no entanto com o facto deste conjunto de canções ser uma celebração do Outono, dos nossos pĂ©s a pisar montes disformes de folhas amarelecidas enquanto o vento passa, e, paradoxalmente ou nĂŁo, uma celebração da contemporaneidade e da fuga desta – do isolamento - , e, finalmente, uma celebração do eterno retorno ao eu, ao interior, ao ego, porque Ă© aĂ que reside, sem dĂşvida, a mais divina forma de poesia humana.