Para todos os efeitos, a escuta de Lush Rush não deve ser conjugada com a de Secret Figure - já que ambos são discos de compositor e, por isso, dependentes do alcance que possa ter uma vontade isolada na busca dos mais tocantes enquadramentos para o piano e instrumentos de cordas (violoncelo e violino), suspeitos do costume nestas circunstâncias. Não é de todo recomendável que a fertilidade exibida por esses se anule em competição. Até porque seria triste impor qualquer condicionante que fosse ao livre trânsito entre texturas que executa agilmente um Lush Rush que é muito mais do que apenas o núcleo clássico referido. Provavelmente digno de que se lhe aponte uma mais versátil sofisticação que a encontrada ao vizinho Secret Figure, o debute da nipónica Midori Hirano aproxima-se do melhor que já lançou a Noble - por influência dos métodos imaginativos que explora para escapar à convenção pré-estabelecida que, muito naturalmente, o agrilhoaria ao chavão de novo-clássico, suporte pronto a servir dose necessária de encanto a uma existência rotineira. Lush Rush garante resultados que o colocam muito acima desse papel acessório. Esquivando-se, com equivalente perspicácia, de quaisquer associações imediatas a Björk ou a Tujiko Noriko (quanto muito, podia-se comparar MH à conterrânea Piana), Midori Hirano explora, de modo surpreendente, todo o tipo de recursos potencialmente capazes de colmatar as insuficiências da instrumentação no que toca a dar corpo a um storytelling mais abstracto, improvável de se conjugar e impossÃvel de se traduzir por palavras exactas (área essa em que, como ninguém, os Books já se aprenderam a mover convincentemente). Cumprem esse papel adições fulcrais como os field recordings autonomamente capazes de formar um espaço surreal e onÃrico, a filtragem ocasional de propriedades acústicas do piano e as trémulas oscilações provocadas por manipulações que variam como o vento. Num âmbito paralelo, Midori Hirano ordena as cordas como um Owen Pallett (Final Fantasy, se preferirem) afincado na apresentação de argumentos dramáticos que comprovem a existência de qualquer coisa semelhante a uma fada-geisha.
E para que não inveje Lush Rush a alegoria prestada ao disco anterior, pode-se afirmar que o próprio representaria perfeitamente a banda-sonora para uma teatralização da Alice no PaÃs das Maravilhas interpretada pelos bonequinhos que produz a Ervilha Cor-de-Rosa desde há alguns anos. E para que não se julgue que fica um passo que seja atrás do disco acima abordado, frise-se-lhe o equilÃbrio intrÃnseco que faz dele um fronteiriço espaço comum entre o que demais salubre produz a sua frente organicamente palpável e a secundária acção digital. Talvez por isso, Lush Rush mereça gozar do estatuto de clássico, enquanto exemplo das qualidades surgidas em matrimónio nos discos da Noble que, a seu direito, mantém em segredo o cerne desses encaixes como se de uma arte anciã se tratasse.