É de apreciar a versatilidade da expressão “A culpa é do macaco...”. Serve para encerrar uma situação assombrada por uma responsabilidade a atribuir, cumpre lugar do desabafo e funciona como sinopse para um qualquer daqueles filmes em que todo o universo entra em colapso assim que um macaco escapa à jaula (em exorcizante alusão mais ou menos directa às presumíveis origens de alguns vírus). Antes mesmo de cumprir metade da sua duração, Hello Mom! - o título que introduz Modeselektor à robustez dos longa-duração - já possui instalados e prontos a cumprir a sua missão sensorialmente estimulante todo o tipo de engenhos infalíveis - nomeadamente, um banquete de cyber-rap moderadamente cacofónico em que os franceses TTC a cerca altura celebram os prazeres do canibalismo. Nesse “Dancing Box”, tal como no house que se lhe sucede, vai sendo explorando o alcance vicioso da simplicidade dos loops e trechos rítmicos que sobrevivem impermeáveis a incontáveis escutas. Detonando a seriedade - que associaríamos a um disco germânico - por meio de uma imprevisibilidade que torna vizinhos amigáveis os ambientes urbanos e um non-sense selvático (“Tetris Pack” suspende linhas básicas em lianas) onde habita o macaco-mascote. Faz, por isso, todo o sentido que à dupla alemã de produtores obtivesse para si a reputação que merecem as guerrilhas. Daí que o percurso Hello Mom! possa ser comparado a uma virtualização não-violenta da ameaça eminente que lançou o clima de tensão das Olimpíadas de 1972 ocorridas em Munique - tal como retratadas por Spielberg e com a agravante de condensar isso em 40 minutos. Nem sequer é Hello Mom! um disco político ou aterrorizante, mas explode em direcções inesperadas a cada altura que o ouvido se decide a assentar sobre a sua parede de artifícios mais aveludados. Ninguém adivinharia por ventura que um par de imberbes produtores alemães se atrevesse a fazer futurologia com a filmografia recente de Quention Tarantino: “Kill Bill vol.4” encontra Gogo Yubari, possuída pela libido infernal de Ellen Allien (patroa da B-Pitch) e Ada, a decepar violentamente a cabeça amarela do peluche Mr. Oizo em jeito de vingança pelo tormento que foi durante meses “Flat Beat”. Ao inquérito bibliotectário que alguém possa vir a colocar a um Hello Mom!, que oferece todo tipo de resistência à permanência num mesmo estado atinadinho (o do house corriqueiro), pode-se sempre responder com um sempre útil: “A culpa é do macaco...”.