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Boards of Canada Geogaddi

2002
Warp


“Music is math”. O tĂ­tulo da segunda faixa de Geogaddi aproxima o duo escocĂȘs da Intelligent Dance Music de Aphex Twin ou Plaid. No entanto, houve sempre, desde o lançamento do EP “Hi Scores”, em 1996, algo mais do que beats sincopados e ritmos nĂŁo lineares. AtravĂ©s de um minimalismo extremamente expressivo, os Boards of Canada sugerem paisagens bucĂłlicas e etĂ©reas, disfarçando uma agressividade sempre latente. De acordo com o interesse pela matemĂĄtica assumido pelo duo, e sendo esta a Ășnica linguagem verdadeiramente universal, os sons que saem de Geogaddi acabam por ser uma complexa rede de fĂłrmulas matemĂĄticas e proporçÔes douradas.

Por outro lado, a mĂșsica dos BoC enche-se de mensagens subliminares que remetem o ouvinte para um universo quase esotĂ©rico e para a famosa seita de David Koresh. SĂŁo precisamente os pequenos detalhes que fazem de Michael Sandison e Marcus Eoin dois vanguardistas da mĂșsica electrĂłnica, recusando o imediatismo das propostas House ou Techno. HĂĄ sempre qualquer coisa de novo a descobrir em Geogaddi, seja que “Magic Window” (a Ășltima mĂșsica do ĂĄlbum-1:46 de silĂȘncio absoluto) seja afinal composto por uma frequĂȘncia nĂŁo audĂ­vel pelo ouvido humano (Marcus Eoin “dixit”) ou que o sample de vocoder usado em “1969” e que parece a priori ininteligĂ­vel seja afinal mais uma referĂȘncia Ă  seita norte-americana (“I could not follow her...She's a devoted Branch Davidian”).

Em relação a Music Has the Right To Children, Geogaddi consegue manter o hipnotismo dos samples analogue cheios de pitch benders e distorçÔes, mas mais experimental e mais denso que nunca. É impressionante o equilĂ­brio do ĂĄlbum, funcionando as mĂșsicas mais longas e as mais curtas como um todo (tĂ©cnica jĂĄ usada, aliĂĄs, em Double Figure, dos Plaid), embora as paisagens sonoras, sempre tensas, irrompam frequentemente em breaks que passam por gritos sintĂ©ticos.

Geogaddi consegue-se, assim, afirmar como mais um elemento importante da discografia jĂĄ extensa de um movimento estĂ©tico que começa a superar de forma absoluta a grande maioria das propostas electrĂłnicas dos anos 90, impondo finalmente os conceitos de conceptualismo e expressionismo Ă  mĂșsica electrĂłnica, fazendo o ouvinte pensar. Music is math, mas, como diria Sol LeWitt, “Os artistas conceptuais sĂŁo mais mĂ­sticos que racionalistas. Eles chegam a conclusĂ”es que a lĂłgica nĂŁo pode alcançar.” E pela lĂłgica nĂŁo se chega ao universo Ășnico dos Boards of Canada.

Para quem quiser saber mais:

Plaid - “Double Figure”
Aphex Twin - “Drukqs”
Dabrye - “One/Three”
Casino Versus Japan - “Go Hawaii”
Markant - “Infam”


Nuno Cruz
30/03/2002