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Jazzanova Belle Et Fou

2007
Sonar Kollektiv


Do espectáculo Belle Et Fou pouco haverá para dizer senão que se trata de um evento cultural em Berlim da responsabilidade de Hans-Peter Wodarz e Arthur Castro - que desafiaram os Jazzanova a escrever a banda-sonora - que junta teatro e dança no mesmo palco. Agora do projecto alemão poucos poderão alegar desconhecimento ou ignorar o seu contributo para a música de à 10 anos para cá. Nascidos em plena ebulição pós-tecno e procurando recuperar o espírito libertino do jazz ou os sentimentos genuínos de uma soul classicista em busca da modernidade, o colectivo conta no seu curriculum com uma mão cheia de remisturas e originais que lhes valeram reconhecimento à escala planetária.

Nunca tiveram problemas de chamar a si o que era dos outros seja no escalão da imaginação recreativa ao apoderarem-se, com uma lucidez invulgar, dos originais alheios, transformando-os, brilhantemente descaracterizando-os e incorporando depois na sua música pequenas partículas sobreviventes da obra inicial ou simplesmente abraçarem convenientemente as suas influências musicais para depois incorporarem a agudeza de espírito dos mestres na sua própria matriz. Tudo tarefas difíceis que poucos conseguirão dominar com agilidade e sabedoria. Mas também o talento não foi distribuído pela humanidade de forma igual.

Remixes 1997-2000 foi, e ainda o é, um perfeito exemplo – antagónico dirão muitos – de como recriar é substancialmente diferente de remisturar. Certo é que granjearam o respeito de todos que tomaram por lição uma verdade, agora paradigmática, de que é possível imprimir uma marca de autor sobre matéria-prima de estranhos. Mas os Jazzanova provaram por varias vezes que nem só das remisturas fazem o seu sustento. Com uma carreira de 10 anos, e mais remisturas que peças próprias, os seis criativos berlinenses contam apenas com um álbum de originais na sua discografia. Também sempre confessaram que trabalhar a matéria particular era um desafio mais complexo do que a apropriação e transformação de ideias de outros. Talvez por isso mesmo In Between de 2002 seja até agora a única prova dada da sua capacidade de erguer um quadro próprio. Tudo o resto não passam de experiências pontuais. E Belle Et Fou é mais uma prova.

Belle Et Fou enquanto compilação de temas de fundo de catalogo não trás nada de novo senão o ecletismo das escolhas – recorda-se, entre outros, a bricolage de Forss em “Flickermood” ou o calor pop/soul de “Just A Lil Lovin” dos Outlines. Agora como antologia/banda-sonora de originais Jazzanova não deixará de ser pertinente referir que o que por aqui se ouve sabe a pouco. O ecletismo mantém-se tal como a produção imaculada e enquanto a programação vai sendo substituida por uma sonoridade cada vez mais orgânica, também o lado mais aventureiro vai se desvanecendo na obcessão dos gostos pessoais dos seus autores. Entre o divergir da componente mais jazz do projecto e a convergência para uma orientação soul blaxploitation intimista – “Rendez Vous” com um Capitol A possuído pelo espírito de Barry White –, um disco eloquentemente orquestrado – “Theme From Belle Et Fou (Bows)” – ou a incursão pela pop/folk melancólica – “The Sirens Call” –, tudo leva-nos a querer que os Jazzanova estão completamente disponíveis a uma abertura a novos léxicos e dispostos a correr riscos em busca de um novo mirante. Apenas o novo álbum confirmará as curtas incursões que aqui ouvimos e tomaremos por certas as mutações na estética sonora do colectivo. Até lá, este espectáculo terá de satisfazer.


Rafael Santos
r_b_santos_world@hotmail.com
13/02/2007