Ao violoncelo de Erik Friedlander não falta experiência. Actualmente uma das figuras de proa do downtown de Nova Iorque - onde colabora com o gigante John Zorn - Friedlander mostrou num brilhante concerto solo no Jazz Em Agosto 2005 porque é um dos mais interessantes músicos da actualidade. Na altura apresentou na Gulbenkian um trabalho baseado nos Cantos de Moldoror de Lautréamont, que conquistou a plateia do pequeno auditório. Em 2004 Friedlander começou uma colaboração com o italiano Teho Teardo, que se traduziu numa troca ideias que resultou numa peça que foi posteriormente incluÃda na banda sonora de “Lavorare Com Lentezaâ€, filme de Guido Chiesa.
No verão de 2005 Teardo visitou Friedlander em Nova Iorque e levou-lhe duas garrafas de vinho tinto e uma ideia para um projecto: um livro de poemas de Pier Paolo Pasolini. A partir dos poemas Friedlander gravou oito temas - alguns eram simples improvisações solo, outras eram compostas por várias faixas de violoncelo gravado sobrepostas. O material foi enviado para Itália e Teardo tratou de retrabalhar os temas, adicionando ainda outros sons, como piano, guitarra e electrónicas. Pelo meio tiveram ainda oportunidade de actuar ao vivo, em Itália (Pordenone) e Nova Iorque (Knitting Factory), espectáculos dos quais resultaram duas faixas, incluÃdas neste disco.
Da junção de esforços entre Friedlander e Teardo nasceu um conjunto de teias temáticas variadas. Se por vezes há aproximações ambientais, outras vezes há acentuação na vertente melódica, contrastando com os momentos mais ritmados. O violoncelo é o centro de tudo, mas à sua volta surgem outros elementos ou transformações. O trabalho da francesa Colleen é uma referência evidente, se bem que não exclusiva: aqui não há a sobreposição de camadas em melodias crescentes, mas há maior variedade estilÃstica e abertura à experimentação.
Pasolini (1922-1975) foi sempre um provocador. Poeta, dramaturgo e realizador, expressou-se sempre de modo frontal, instigou o pensamento contra a ordem estabelecida, agitou as instituições e consciências. A música inscrita neste álbum chamado Giorni Rubati (“Dia Roubadoâ€) não é de modo algum provocadora. Erik Friedlander e Teho Teardo usaram a provocação como inspiração, mas a homenagem resultou tranquila. Esta música, criativa e bela, não tem o intuito de agitar mas, pelo seu carácter poético, é a melhor das homenagens à arte de Pier Paolo Pasolini.