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Tanakh Ardent Fevers

2006
Alien8 Recordings


Pese embora o prejuízo que pode constituir, acrescentar a esta introdução, um duplo e pesado name dropping, importa, antes de mais, estabelecer as semelhanças que os Tanakh mantêm com nomes tão recomendáveis como os Califone ou Calexico – esses que, por mérito próprio, mereceram ver os seus desígnios atribuídos como adjectivos. Posto isto, e porque o ricochete estilístico se escuta um sem número de vezes entre a trindade proporcionada, as comparações geradas desconhecem travo de língua e só muito dificilmente falham o alvo – declare-se a bel prazer: Repara como soa a Califone o embaciar da guitarra acústica que, em “Hit the Groundâ€, se obscurece de um cinzento recuperado a sons captados a uma rua com trânsito., Não sobram dúvidas de que paira sobre “Deeper†– e sobre as suas harmonias vocais resplandecentes - um perfume fronteiriço muito Feast of Wire dos Calexico. Todas essas seriam verdades, porém, improváveis absolutismos – quando Jesse Poe (o sol Tanakh à volta do qual giram os satélites colaboradores) acumula a quota mínima de momentos inspirados, que, normalmente, facultam a quem os produz a tal “palavra a dizerâ€.

A palavra, conforme o que dá a escutar o quarto disco Ardent Fevers, passa pela intervenção incisiva a que se sujeita – por adição ou subtracção – a inesgotável fonte de pistas de que ainda dispõe toda a folk ramificada por influência estimulante do psicadelismo. Esse que era muito mais presente e endiabradamente étnico em Villa Claustrophobia e que, na sua forma mais declarada, só surge a tempos em Ardent Fevers (nomeadamente numa “Still Trying to Find You Home†cujo solo de guitarra aspira à grandeza daquele que arrebata tudo e todos em “Cortez, the Killerâ€, inesquecível momento de Neil Young com os Crazy Horse). Contudo, fica-se por aí o que de mais concretamente febril efervesce ao presente disco dos Tanakh. Sendo que o abandono do psicadelismo de outrora parece ter facilitado a infiltração ao que de mais cinemático tem para oferecer a Itália de Morricone ou Nino Rota. E será que parece assim tão descabido existir uma variante ainda mais elegante para o Oeste Mesclado de Burns e Convertino (que, nos Calexico, são igualmente influenciados pelos compositores transalpinos)? A julgar pelo levitante efeito de um romantismo ao quadrado, parece que não.

Há por aqui, como já se percebeu, Americana alicerçada por enorme sofisticação técnica (garantias pós-milenares) e um escritor de canções a que falta um “bocadinho assim†para ser de topo. Sobra, porém, a Jesse Poe sensibilidade suficiente para explorar um sexto sentido que, a partir de coordenadas referenciais evidentes, vai conseguindo mapear uma autónoma convicção artística e poética. Ardent Fevers pode bem ser o disco que antecede ao que virá a definir uma carreira.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
01/01/2007