A primeira ideia a surtir Do Easy, segundo disco dos manÃacos Giddy Motors, é de que alguém decidiu adormecer levar o empenho a adormecer sobre louros previamente arrecadados. A segunda – bem mais grave e dolorosa – obriga, de alguma forma, a redimensionar o volume das expectativas atribuÃdas ao grupo que, em 2002, detonava – sem aviso prévio – um fulgurante e fértil Make it Pop!, que violava a noção mantida acerca dos discos da Fat Cat – supostamente mais cerebrais - com um rock marginal, fungoso, organizado triangularmente como um rodeo de latrina (onde a ágil guitarra toreia a mais primitiva secção rÃtimica). A desilusão perante esse passado adensa-se se for colocado sobre o prato positivo da balança o single Magnamic, a que bastava o riff de guitarra que trespassava a esquizofrénica “Eisbar†para ser memorável, senão mesmo obrigatório. Porém, cedeu ao ócio o trio britânico e a consequências disso acaba por ser um Do Easy algo desastroso.
Não se julgue, porém, que este é um de crise de identidade: os Giddy Motors continuam iguais a si mesmos e a uns Jesus Lizard a que devem muito – por apropriação da geometria rude da guitarra e regência atribuÃda ao elemento que, com maior convicção autoritária e azedume, se impuser no manicómio instrumental. Essa transposição de qualidades chegou a ser bem sucedida, enquanto que gora não encontra forma de abandonar um vazio que faz de Do Easy um manifesto de falta de zelo. E o desleixo britânico não deve ser perdoável só porque se pode confundir com o humor conterrâneo. Aquando do lançamento de Do Easy, os Giddy Motors e a Fat Cat fizeram questão de frisar que os custos de produção deste segundo disco rondaram os 1300 euros e que a mistura teria sido conduzida por um ilustre desconhecido de 21 anos num qualquer software comum e de modo totalmente digital.
Estranho mesmo é, em pouco tempo, perceber que a desertificação de ideias e ausência quase total de hooks agrava a queda de cavalo para burro que se sucede com o câmbio de produtores ocorrida entre o Midas da imundice Steve Albini, que se ocupou de oferecer um tratamento milagroso a Make it Pop!, e um precoce Tobias Warwick-Jones, a que alguns já reconhecem o talento de mago DIY. Podia até o lunático frontman Gaverick de Vis grunhir cem vezes
Como se não bastasse a Do Easy contar apenas com 33 minutos mÃnimos à qualificação como longa-duração, o trio londrino comete ainda a proeza de despender de duas das oito balas em câmara com a inconsequência arrogante de uma “End Gameâ€, cuja gravitação pós-rock – novidade neste universo - se encontra uns furos abaixo do que os Cure remetem ao parcial obscurantismo dos segundos discos que acompanham os clássicos actualmente reeditados, e com o pseudo-experimentalismo de uma “Dot Dot Dot†que, entre ruÃdos esparsos, deve ter adormecido um a qualquer sentido cómico que só muito dificilmente conhecerá militantes nos escritórios da Fat Cat (onde os Motors não deixam de parecer deslocados). Os Yellow Swans punham um ovo semelhante a este “Dot Dot Dot†enquanto Tracy Chapman maquilhava o rosto. Subtraiam-se ambas as inutilidades a um disco de si insuficiente e sobra – com Franciscana generosidade – quanto muito um EP.
Contudo, Do Easy não se livra de provocar aquele embaraço que vira as duas palmas para o céu e coloca a questão inevitável:Aguardei quatro anos para isto?!.... Tanto mais quando o convÃvio alongado com o indesejável segundo disco dos Giddy Motors só expõe mais detalhadamente as suas fragilidades, que, a serem frontalmente enumeradas e resumidas, podiam limitar-se a duas incontornáveis certezas: Do Easy é demasiado indistinto entre as suas partes válidas e notoriamente insuficiente ao forrar das paredes do estômago dilatado por Make it Pop!. Fala-se por aà de um futuro indeterminado para o trio. Assim seja, se necessário. Londres reclama o abatimento de uns Giddy Motors que melhor teriam feito caso se tivessem ficado pelo mito menor gerado por um surpreendente debute que não encontra por aqui quem lhe roce sequer a cintura lasciva.