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Linda Draper One Two Three Four

2006
Mushroom Pillow / Popstock!


Há questão de dias Devendra Banhart revelava numa entrevista ao site Pitchforkmedia que, numa altura de maior carência da sua vida, a música da quase lendária cantora folk Vashti Bunyan servia-lhe de sustento alimentar e alento. Nutrição para alma do bardo que Michael Gira descobriu a bares pouco asseados. Aquém de uma primazia que a permita ser banquete espiritual, Linda Draper – ou a própria personificação da serenidade de tons verde – vai produzindo música de guitarra acústica sobre o regaço e ocupando o lugar que na roda de alimentos folk pertence aos vegetais que complementam, mas que dificilmente preenchem um prato solitariamente.

Além de recuperar um mote punk-rock, o título One two three four numera a quantidade de discos que Linda Draper já comporta em portfólio e verbaliza o ritmo em que se baseiam as suas composições supra-leves e de branda combustão. Linda Draper não precisa de muita saliva para dar forma as suas imagens simplórias e bucólicas e essas pinta com uma língua inglesa que fica sempre bem e nunca atraiçoa ninguém. "The Broken Muzzle" encontra-a uns furos acima da média na exploração lúdica de uma série de jogos de palavras. A atenção desperta para todos aqueles trocadilhos. "Seven black crows" conta com um fundo caribenho muito semelhante aos que a dupla sueca The Knife criou para silent shout. Vicia após um par de audições.

A elevação até a um amnésico plano especial está praticamente garantida assim que One Two Three Four dobra o cume "The Broken Muzzle", mas não é menos verdade que falta aqui um qualquer condimento que torne relevante Linda Draper e a transponha para perto dos songwriters de cabeceira. Serve, no entanto, como um tradicional cous-cous a que se volta quando a cerimónia não é muita e a fome pede apenas uma leve refeição que lhe sirva o capricho imediato.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
29/07/2006