Haja divisão do coração arquitectonicamente apta a ter uma porta do cavalo para receber escritores de canções insuspeitos, e um talento inesperado como Troy Von Balthazar merecerá que seja prontamente estendida passadeira vermelha à sua imensa aura de excentricidades várias, sexismo trivialmente inofensivo, parafusos soltos que expeliu a sobrecarregada caixa de Pandora que abarca as songs in the key of Z (conteúdos de um cancioneiro que a convencionalidade eclipsou por completo).
Bom dia, estranheza. Um nome como Troy Von Balthazar – que usaria Isaac Brock ou Josh Homme para se auto-parodiarem - necessita obrigatoriamente de factor respeitável que lhe sirva de antĂdoto. O alivio surge quando se investiga o pedigree indie que acumulou o havaiano na liderança da refundida entidade Chokebore que, durante anos, mereceu o digno selo da Amphetamine Reptile. TVB admite, inclusive, que desde sempre compĂ´s inicialmente em regime acĂşstico e que lhe aborrecia o facto dos companheiros de banda demasiadas vezes barrarem com sujidade distorcida aquilo que pertencia servido em simplicidade linear. Assumir, de vez, a carreira a solo foi, por isso, a primeira e Ăşltima das decisões lĂłgicas cometidas por quem assume o seu desejo egoĂsta no tĂtulo homĂłnimo atribuĂdo ao seu primeiro disco longo.
Tudo o resto Ă© um glorioso e excitante descalabro de seriedade e valores familiares monogâmicos. NinguĂ©m, no seu perfeito juĂzo, dá inĂcio a um disco como se estivesse a encenar um vĂdeo-amador onde uma figura feminina Ă© impelida a promover as qualidades manuais do prĂłprio realizador. A “TVB has fingers” sĂł falta a nudez factual para ser um item popular nas buscas de Google. A “Dogs” nĂŁo falta absolutamente nada para ser um consensual hino de make out / curtição. É vĂŞ-lo harmoniosamente disposto entre a dicotomia de uma voz feminina – a da ilustre desconhecida Adeline Fargier – clĂnica nas notas musicais percorridas e a voz masculina que apenas as atinge por aproximação. Habita por aqui a fricção eminente entre extremos como canonizada por Gainsbourg e uma aveludada dislexia errante no refrĂŁo:Bad people happen to things like me. TVB sussurra felino como quem sorve mel espalhado por dois ombros lisos. Catalogar, por favor, as propriedades estimulantes de "Dogs" ao lado das do pau de Cabinda. Uma tardia "Old Black Joe", recuperada ao legado de mĂşsica tradicional, conhece vida renovada como mĂşsica de presĂ©pio com pilhas gastas.
O argumento de maior peso em defesa da insanidade de Troy Von Balthazar será o brilhantismo multiplamente distinto e distinguĂvel de que usufrui para em 16 ocasiões diferentes mandar Ă merda ortodoxia que normalmente Ă© a morte do songwriter pastelĂŁo (Vanderslice?). Escute-se “Bad Controller” e, em pouco tempo, repare-se em como a voz demonĂaca sabota a cruel eficácia de um turbilhĂŁo emocional que o xilofone trata de tornar as lágrimas de um palhaço alegre.
Urge realmente coroar alguém que, mesmo afecto a um código que combina alma torturada e guitarra confessional, consegue elaborar um sincero e carnal manifesto em prol da natalidade e livre trânsito entre comunidades de fuck buddies. Rói-te de inveja, Adam Green. Toma nota, Devendra. É com a convicção que me faz depender de Either / Or - a maior das dádivas que deixou por cá Elliott Smith - para tantas vezes serenar dias piores, que estabeleço Troy Von Balthazar como o mais recente integrante do selecto clube reservado a songwriters de culto. Nada prepararia quem vigia a porta do cavalo para a gratificante surpresa que se veio a revelar este impressionante debute em nome próprio.