Parte condenado Ă partida um produto que procure junto de um grande pĂșblico vender a imagem de um Arnold Schwarzenneger grĂĄvido por inseminação artificial. A Universal mediu mal o paladar a uma audiĂȘncia â cada vez mais interessada em acompanhar o apogeu Miramax -, quando em 1994 lançou para os cinemas Junior, que rapidamente confirmou a sua natureza fracassada. Assim era porque, entre os pagantes, o homem comum nĂŁo suportaria a ideia de um Schwarzenneger grĂĄvido (incapaz de manusear artilharia pesada), a dona de casa dificilmente simpatizaria com essa imagem grotesca e ao curioso casual nĂŁo interessaria conviver durante hora e meia com o sotaque forçado de Emma Thompson. AlĂ©m do mais, ainda estava bem presente na memĂłria colectiva o famoso e desde aĂ saturado âHasta la vista, baby!â, que serviu de slogan Ă sequela de Exterminador ImplacĂĄvel. Posto isto, todo o contexto de concepção que encaminha Junior ganha uma leitura bem mais macabra , quase contra-natura. Contudo, vale Junior pela tentativa de aplicar Ă vivĂȘncia masculina as sensaçÔes de um parto.
Mark Nelson â o nome que oculta a transversalidade de Pan American - vai mais longe e procura com For Waiting, For Chasing sumariar o perĂodo psicolĂłgico que lhe tomou a assimilar a ideia de que seria pai. FĂĄ-lo com uma discrição zen (que sai favorecida pela presença de metais orientais logo na primeira faixa) e atravĂ©s de apuradĂssimo sentido aplicado Ă manipulação temporal (âLove Songâ descreve a ternura de um momento, âFrom Hereâ o ponto inicial de uma eternidade). Tratou a vienense Mosz de arriscar no testemunho de alguĂ©m que, sem o receio de alienar os que lhe seguem o rasto, se entrega Ă feitura de um disco absolutamente intimo como Ă oportunidade que oferece uma segunda vida.
Talvez por partir de um novo inĂcio, For Waiting, For Chasing Ă© um disco que se expande a cada vez que acumula entusiasmo sobre o que o futuro antecipa e que reflecte sobre decisĂ”es tomadas a cada vez que tem as encruzilhadas da vida pelas costas. Sendo a primeira ocasiĂŁo mais frequente: talvez numa percentagem de 75% para 25%. E sendo essa faceta dominante a que tambĂ©m lhe serve de pretexto ao cultivo da horizontalidade sem fim Ă vista da mĂșsica para aeroportos que compĂŽs Brian Eno â acrescendo a isso o facto do universo aĂ©reo ser simpĂĄtico a ambos. Com abordagens distintas entre si e Ă luz do percurso recente, Pan American garante alguns pontos de interesse e sacrifica outras tantas caracterĂsticas que, atĂ© The River Make No Sound, garantiam ao projecto um selecto nĂșmero de entusiastas. O interesse estimulado pela tentativa individual de cada um na leitura do pensamento a Mark Nelson - com base num tĂtulo como âFrom Hereâ e a variedade tonal infinita que oferece o seu debulhar de ruĂdo branco, uma batalha organizada entre espirais vertiginosas e uma distante precursĂŁo a que parece ter sido aplicada um silenciador engendrado por Aidan Baker (figura de proa do drone canadiano). âFrom Hereâ tambĂ©m conta com o balanço a que almeja actualmente Mark Nelson (conforme o prĂłprio garante em entrevista cedida ao Bodyspace). Depois, os sacrifĂcios evidentes na total ausĂȘncia de jogos pop ou batidas a que se podia agarrar um raver intelectualizado. O abandono da escassa facilidade que ainda oferecia o Ășltimo disco fluvial de Pan Am.
Enfim, Ă© um disco mais complexo. For Waiting, For Chasing descreve em frentes mĂșltiplas o embater de uma vontade humana contra o pesar de uma decisĂŁo irreversĂvel. E Ă© a partir das reacçÔes que isso produz que lapida o seu conjunto de camadas gasosas ou contrapontos ultra-sonoros. A cada vez que procura serenar um raciocĂnio, Mark Nelson abafa o crepitar empolgado das suas componentes mais ruidosas e evapora-se num imenso clarĂŁo. Aquele que na sĂ©rie Sete Palmos de Terra oferece os segundos de que necessita o raciocĂnio para encadear o acontecimento, aquele que no presente disco serve de separador aos diversos sentimentos que se abatem sobre alguĂ©m pela primeira vez a braços com a paternalidade.