Se um estranho o convidar traiçoeiramente a juntar-se a uma festa privada que é apenas fachada, isso pode bem ser Helping Hand - terceiro álbum da dupla francesa que agora edita pela Sub Rosa. O debochado “You’re in for it†é uma promessa vã (na medida em que antecipa um disco que não existe), uma espécie de hino de recepção da mansão Playboy que luxuriosamente explode em sopro e transe conduzido por graves. Enganador face ao conteúdo bem mais comedido que se lhe segue no alinhamento, “You’re in for it†constitui afronta à noção que se tem do inÃcio de um disco Sub Rosa (que, enquanto adjectivo, designa algo de natureza confidencial, privada ou secreta). Não é de fiar a mão supostamente auxiliar dos multi-instrumentistas François Rasim Biyikli e Charles-Eric Charrier.
Quando um raver se julgava em casa, eis que Helping Hand passa a ser mais elegante, sugestivo, próximo da utopia que podia representar o melhor Carter Burwell apostado na composição de sequelas para Kid A e Amnesiac. Com isso, passa de óbvio a enigmático. Simetrizado a partir de um núcleo baço, Helping Hand faz crer que o teor lúdico das suas balizas pode ser apenas um tónico que facilite a viagem a um centro abstracto - à medida que se verifica um êxodo de constituintes que o ancoram a um invulgar corpo de melodia, vai-se deixando dominar por uma maior densidade de afectados elementos electro-acústicos (alguns desses até cáusticos) e aceitando no seu interior um claustrofobismo, que foi obrigado à redefinição com o surgimento de IrreversÃvel do maquiavélico Gaspar Noé.
É este um disco ambiguamente cinemático que, no lugar dos truques na manga, oculta diversos suportes dramáticos para tudo o que possa servir como peça ao puzzle narrativo: um nostálgico diálogo de despedida, um reencontro iluminado pela frieza de um hospital, a angústia imediata de um assalto mal planeado. Cada faixa corresponde potencialmente a uma variedade aleatória de cenários. “Separationâ€, por exemplo, desafia os limites do suportável ao trepar - com uma guitarra em vertiginosa agonia – uma rama onde florescem as passas do Algarve. É um momento de aperto. Serviria na perfeição à sonoplastia do publicitado parto da Ãgata, caso tivesse sido filmado pelo Lars Von Trier do horrendo O Reino.
Helping Hand singra sobretudo por nunca emperrar numa seriedade estática que possa sugerir a formalidade do aspecto de banda-sonora para filme imaginário. Quando é interrompida a coolness da golpada criminosa que lubrifica “Revenirâ€, escuta-se um sussurrado “Oh, merde...†e evapora-se repentinamente toda a solenidade construÃda pelo piano até aÃ. Vincent Cassel esqueceu-se de deixar les escargot de molho. Sobra como alternativa um temperado caldinho de cinefilia pronta a montar mentalmente.