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Windsor for the Derby Confianza / Visiones EP

2005
Acuarela / Popstock


Três salvas pela acção mecenática da Acuarela Discos na divulgação de emergentes talentos indie e atracção desses até ao cantinho peninsular. Merece especial consideração a label que agiu de ponte estratégica na vinda de Destroyer ou Lou Barlow ao burgo luso. Destroyer havia já contribuído para uma compilação da label madrilena com a auto-elucidativa “Song for Acuarelaâ€. Lou Barlow agradece nos diários do seu site o auxílio logístico da Acuarela na sua mini-digressão ibérica. Ambos deixaram saudades ao sagrado aquário da Zé dos Bois. Mas os laços da aliança luso-castelhana não se ficam por aqui: a compilação onde participara Destroyer incluíra nesse segundo disco um inédito intitulado “Each One as Loversâ€, que será provavelmente uma das mais gráficas músicas conhecidas ao reportório do nacionalmente consensual Old Jerusalem (tendo mesmo ferido susceptibilidades quando apresentada em Paredes de Coura ’04). A inclusão é, em todo o caso, louvável. Perante este câmbio fronteiriço, urge receber a Acuarela com três salvas adicionais pela preservação em catálogo do momento distinto que os Windsor for the Derby atravessam.

Antes de ditar bitaite que seja relativamente ao EP que motiva a este resenha, convém actualizar quem, entre mudanças de formação e lançamentos em catadupa, possa ter perdido o rasto aos Windsor for the Derby (os restantes podem também aderir à comitiva). Do projecto, sabe-se que, até à feitura do último disco (Giving Up the Ghost), não impunha restrições quanto à entrada e saída de membros – sendo que a manutenção dos mentores Dan Matz e Jason McNeely permaneceu assegurada, mesmo que à distância de vários estados (unidos). Outra das característica inalienáveis a apontar aos WFTD diz respeito à instabilidade da linearidade que parece existir apenas a nível subterrâneo (de forma a não impedir a anexação de novos elementos). Só assim se explica que em tão escasso tempo se sucedam discos como Repetition and Difference - alquimia da intimidade extraída a guitarras corcundas – que os revelou ao mundo pela mão de Michael Gira, capítulos intermédios onde dinâmicas ambientais se revelavam gradualmente e a digressão voyeuristica sobre ninho de revestimento indie descrito no recente (e bem conseguido) longa-duração Giving Up the Ghost (o disco que consolidou os Windsor for the Derby como banda, atendendo a que, a título inédito, foi gravado num mesmo espaço físico e não à distância, como era habitual). O facto de Confianza / Visiones ser o primeiro registo a documentar a estadia congregante em Filadélfia, leva a que a lógica se ocupe de tomar o EP lançado pela Acuarela como a manifestação paralela que se antecipou à tendência de Giving Up the Ghost no rompimento com o passado. Os Windsor for the Derby agora são uma banda. E já não será muita a distância que os separa de alcançar o estatuto de instituição.

Dada a sua condição exorcista, Confianza / Visiones actua um pouco como uma desintoxicação cumprida em intensidades várias, na sua maior parte próximas da estratosfera ocupada pelas ramificações mais gasosas do rock (space, pós- e por aí). “Confianzaâ€, por exemplo, representa, no seu serpentear sigmático, um hino de dança preservado em surdina, algo muito próximo do flirt que “Money†dos Ölga assume com aquela explosão dourada por consumar. “Visiones†patenteia a forma dos passos que conduziram a Giving Up the Ghost. Adivinha-se marcha sonâmbula a guitarras e baixo nebulosos, embaladas por ritmo techno esquelético. “No Tekno w/ Drums†(captada a um concerto em Itália) soterra a martelo persistente (semelhante ao da ritmada “The Hammerâ€) qualquer impureza que reste a Confianza / Visiones. Isto para que nova etapa seja encarada pelos Derby como página em branco.

Além das sensações de leveza que oferece o convívio com estes exercícios de insuflação a hélio, volta um disco dos Windsor for the Derby a surtir o mesmo efeito póstumo: não há persistência que consiga resgatar melodias para mais tarde contar a história. Parece ser essa uma das alíneas constantes do pacto mantido com os guitarristas Matz e McNeely: gozar da aptidão cronometrada que permite vislumbrar a ponta ao icebergue sentimental de ambos e abrir mão dessas memórias à saída. Mais que nunca, um disco de WFTD assume-se como ponto de controle alfandegário. Algo a declarar?


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
23/01/2006