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V/A Science Fiction Jazz Volume 9

2005
Mole


Por vezes os títulos que classificam os discos pouco ou nada têm que ver com o seu real conteúdo. Por vezes, talvez após sessões de criativo brainstorming, são dados nomes deslumbrantes e fantasiosos, que criam uma certa aura num disco que depois acaba por não ter correspondência alguma na música. No entanto o objectivo primeiro é quase sempre alcançado: o marketing seduz, gera curiosidade – os curiosos ouvem e depois, se gostam, levam para casa. Assim se completa um círculo com todas as partes satisfeitas. Claro que outras vezes o consumidor vai ao engano e acaba por levar gato por lebre.

A série Science Fiction Jazz, que acaba de editar o seu novo (nono) volume, é um caso paradigmático da anterior constatação. O que se poderia esperar de um disco com um título destes? Jazz em versão futurista, imaginamos. Claro que ninguém pode saber como será o jazz do futuro (Ornette Coleman, que chamou a um disco seu “The Shape of Jazz to Comeâ€, sabia, mas ele é génio). E como (mais) ninguém sabe, fica ao critério da imaginação de cada um os sons prováveis que definem jazz em versão ficção científica. Assim sendo, uma compilação de electrónica levezinha poderia usar um título destes. Assim foi. Estávamos em 1996 e assim foi editado o primeiro volume Science Fiction Jazz.

Compilados pelo suíço Robert Jan Meyer, identificado como Minus 8, os volumes da série SFJ têm sido relevantes mostras da electrónica mais relaxada. Fundamentais na segunda metade da década de 90, numa altura em que as modas estavam a favor, estas compilações foram montras importantes na secção downbeat/chill-out/nu-jazz-whatever. As selecções dos vários volumes Science Fiction Jazz foram revelando o notório bom gosto do produtor, que em simultâneo produzia também criações originais de importante relevância (a associação à editora Compost, editora fundamental na música electrónica moderna, não foi à toa). A selecção de cada volume, com uma edição sempre regular, foi também acompanhando com atenção a evolução da música.

Neste 2005 em que uma certa popularidade hegemónica da electrónica de outros tempos já lá vai, assiste-se hoje uma larga diversidade de propostas sem fio condutor comum. Chegados ao volume número 9, chega também a questão à qual é impossível fugir: qual a relevância de mais este volume? Minus 8 tenta responder. Pegando em bocados daqui e dali faz-se uma salada regada a electro, que o obrigatório revival dos 80s repescou, e constrói-se uma sequência equilibrada de coisas dançáveis, mas de relevância artística pouco evidente. A versão de “Heart of Glassâ€, logo a abrir, é um rebuçado. Infelizmente não há muito mais para adoçar a boca e a coisa torna-se rapidamente cansativa. Neste momento já não há muita paciência para música de bar e esplanada (a menos que sejamos os proprietários) – e estamos no Inverno, lá fora está frio, o que apetece é ficar por casa a saborear algo mais consistente e reconfortante em frente à lareira acesa. Se o jazz nunca passou por aqui, a ficção científica ameaça ficar ultrapassada. Não é caso para ficar triste, querida, teremos sempre os primeiros volumes.


Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
19/12/2005