Guitarrista, compositor e investigador, o português José Dias tem explorado a música em diversas áreas e de diferentes perspectivas. O músico português, que reside em Manchester, tem desenvolvido um interessante trabalho de investigação na Manchester Metropolitan University e realizou o documentário “Those who make it happen”, sobre a cena jazz portuguesa, em 2016.
Na qualidade de músico, Dias já editou três discos, todos em contexto jazzístico, todos publicados pela editora Sintoma Records: no ano de 2013 editou o seu disco de estreia, 360, gravado em quarteto (com Moisés Fernandes, Pedro Pinto e Rui Pereira); gravou depois Magenta, em trio (com Nuno Oliveira e Alexandre Alves); e em 2016 chegou ao terceiro álbum, What Coul Have Been, de regresso ao quarteto. Nesses três discos mostrava-se um interessante guitarrista e compositor, trabalhos enquadrados pelas dinâmicas de comunicação jazzística.
Agora o guitarrista apresenta uma faceta distinta, revelando um trabalho musical substancialmente diferente daquele que tinha mostrado anteriormente. Este disco After Silence, Vol. 1 é editado pela Clean Feed, a label portuguesa que tem atravessado fronteiras, naquela que é a 10ª edição das “Guitar Series” - série de discos de guitarra que alberga os discos de Elliott Sharp e os vários volumes das excelentes compilações I Never Metaguitar.
Para este álbum José Dias deixa de lado a natureza jazzística que caracteriza a obra anterior e entra numa pura exploração a solo da guitarra elétrica. Dias serve-se apenas da guitarra eléctrica e de pedais de efeitos, não se serve de composição convencional, trabalha a exploração do som, uma viagem solitária de pesquisa e descoberta. O resultado é uma música ambiental, paisagística, tranquila. Os universos sonoros contam histórias, cada música evolui tranquilamente, com suaves mudanças de direção.
Todos os temas têm títulos curiosos que reclamam imagens vívidas. Os temas têm títulos poéticos, cinemáticos ou mesmo enigmáticos: “Now He's The Hunter Now He's The One Being Hunted”, “The Flickering Image Will Not Go Away”, “Whilst Deciding Whether He Should Kiss Her Or Not”, “The Men In Dark Suits Are Coming” e “The Light Could Almost Blind Him” são alguns dos nomes das músicas.
O ouvinte poderá tentar enquadrar este disco consoante as suas referências particulares: a música é, em si mesma, cinemática (poderemos falar num Ry Cooder sem destino), assume uma forma ambiental e atmosférica (inevitável referir o Rafael Toral da guitarra, pré-2004, embora aqui menos estático), trabalha uma veia experimental (de Fred Frith a David Torn?), serve-se de uma inteligente economia e eficácia de recursos (Mary Halvorson) e revela uma inusitada suavidade para música exploratória (será despropositado evocar a elegância de Bill Frisell?).
As referências poderão ou não fazer sentido, contudo, este é apenas um exercício de enquadramento para o ouvinte. A verdade é que o guitarrista trabalhou, procurou e encontrou a sua voz. A música é original, a música é de José Dias, esta é a sua voz. E, conforme próprio o título do disco anuncia, esta é apenas uma primeira parte de algo maior, depois virá algo mais. Venha daí mais música desta.