A voz de César Lacerda não é uma voz. É um sitio onde se estar. É como ir a um cinema, ou ver um concerto, ou ir a uma biblioteca. A voz de César Lacerda é um cantinho onde colocar um sofá. É um lugar para se passar horas a fio, é um móvel da casa, é uma mesa posta durante semanas. E isso, isso é muito bom.
Tudo tudo tudo tudo, o terceiro álbum a solo do músico mineiro, é apenas mais um episódio da sua contínua afirmação como escritor de canções. Porque há artistas assim: que se afirmam um pouco mais a cada disco, sem grandes alaridos ou campanhas, centrando tudo nas canções e nada no resto.
Sendo um disco pop, e assumidamente pop, Tudo tudo tudo tudo não esconde nunca a sua genealogia brasileira. É acima de tudo um disco elegante e variado. Há espaço para uma canção como “Isto também vai passar”, directa e pura, mas também outra como “O Marrom da sua cor”, samba-implosivo com as cores e a fantasia que só podiam ter vindo daquele país.
César Lacerda é um fantasista. Mesmo quando não quer. Mesmo quando quer fazer uma canção directa e concreta, a poesia das suas palavras ou a geometria das suas canções arranjam maneira de trocar as voltas e levar tudo para outro lugar. “Sei lá, mil coisas”, delicioso devaneio melódico, é um exemplo perfeito disso.